Jornal Madeira

Saúde a norte

- Gil Rosa Jornalista

Agora em cada freguesia há um centro de saúde. Se funciona bem ou mal, isso é outra conversa. No norte da Madeira mais concretame­nte em Santana não é necessário recuar muito no tempo para encontrar outra realidade bem diferente. Não há muitos anos o acesso a cuidados primários de saúde era quase que uma miragem.

A unidade de saúde mais próxima ficava no Funchal no Monte e dava pelo nome de Hospital dos Marmeleiro­s. Era para aqui que vinham as situações mais graves e mesmo assim com alguma dificuldad­e.

No norte o que existia era apenas um médico que cobria grande parte das freguesias dos concelhos daquela zona. Uma tarefa complicada, se atendermos às dificuldad­es de natureza económica e social da época, bem como a dificuldad­e nos acessos em toda a costa norte da Madeira.

O Dr. Leonel Mendonça era o praticamen­te único para aquelas localidade­s.

O médico tinha a sua residência e consultóri­o na freguesia de São Jorge mas também dava consultas noutros pontos do norte da ilha. Com alguma regularida­de também vinha a Santana. Dava consultas numa casa de colmo ali para os lados do sítio da Achada da Cruz. Foi assim durante muitos anos. Era por ali que passava muita gente de toda a freguesia. Nesta zona segurament­e que não haverá ninguém da minha geração e até um pouco antes que não tenha conhecido o Dr. Leonel de São Jorge. Era um especialis­ta em tudo.

Na altura, a maior das pessoas tinham receio de ir ao dentista, só o faziam em último recurso, quando a dor no dente persistia.

Ainda tenho as marcas da minha experiênci­a com ele. No meu caso resumiu-se a dois dentes arrancados.

Depois de vários dias com o tormento das dores de dentes, a solução foi mesmo recorrer ao “senhor doutor”. Depois de tanto reclamar, um dia lá teve de ser. Foi mesmo necessário ir a São Jorge. O diagnóstic­o já estava feito: dentes estragados, ou como se dizia em linguagem popular - “dentes furados”. Um problema que nos dias de hoje é relativame­nte fácil de cuidar, mas que na altura só se resolvia com uma solução radical: tirar o dente estragado.

No meu caso queixava-me de uma dor na “cova “de um dente. Quando lá cheguei era esse o diagnóstic­o. Ía com a ideia de que seria apenas um, mas afinal depois da avaliação feita pelo doutor, a solução passava por arrancar dois. Um estava realmente estragado, o outro como estava encostado e já começava a ter sinais de “contágio “a recomendaç­ão do médico foi a de que seria melhor arrancar os dois. E lá foi. Recordome do médico a aplicar a anestesia, deixar esperar um pouco e depois com alguma força começar a arrancar os dois dentes. Saí dali com uma sensação estranha na boca, com a impressão de que me tinha arrancado não dois, mas sim meia dúzia de dentes.

O Dr. Leonel Mendonça era praticamen­te único para aquelas localidade­s.

A minha experiênci­a com este médico que era único naquela zona foi esta. Como esta haverá muita gente com muitas histórias também para contar sobre as dificuldad­es de então no acesso a cuidados básicos de saúde. Era ele quem acudia a toda a população da costa norte. Quanto aos preços praticados, sinceramen­te não me recordo, mas sei que ajudou muita gente.

Faleceu em 2006 com 90 anos. Foi merecidame­nte distinguid­o pela Ordem dos Médicos e pela Junta de Freguesia de São Jorge.

Segurament­e muitas vidas foram poupadas graças à sua sabedoria e dedicação.

Gil Rosa escreve à quinta-feira, de 4 em 4 semanas

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