Capela da Nazaré à mercê dos toxicodependentes
Capela com quatrocentos anos de história, de valor artístico e patrimonial está a ser alvo de intrusos. É privada, mas o Governo Regional tem apoiado na conservação.
A Capela de Nossa Senhora da Nazaré, situada no Caminho da Nazaré, em frente à Quinta da Bela Vista, a meio caminho do Pavilhão do CAB, está a receber ‘visitas’ indesejáveis.
Quem desconhece este pequeno templo, é bem capaz de passar pela rua sem se aperceber da sua existência. Quem teve a oportunidade de a conhecer, quando estava aberta ao culto, como uma moradora com quem falámos, descreve-a como “muito airosa” e dotada de “uma excelente vista onde dava para ver o fogo do Fim do Ano”. Isto para além do valor patrimonial e histórico que detém.
Alertado para uma situação de aparente abandono, o JM esteve no local. Quando pensávamos que o exterior estaria apenas coberto de ervas e matagal, viemos a constatar que a propriedade está a ser alvo de intrusos.
Um rasto de lixo, espalhado pelo chão, é revelador de presença humana no interior, apesar de se manter fechada há já alguns anos.
Abordado pela nossa reportagem, um homem que se encontrava a trabalhar nas redondezas disse-nos que o local é procurado por toxicodependentes para se drogarem e mostrou-nos como o fazem.
“Eles entram por aí. Arrancaram um ferro e agora enfiam-se”, indicou o homem.
À primeira vista, o gradeamento, bastante alto e finalizado no topo com arame farpado, faz parecer que a propriedade é impenetrável e que o lixo foi atirado para dentro. Só que não.
A passagem improvisada, com a subtração do ferro, é estreita, mas com medida suficiente para ser transposta por indivíduos magros.
Sacos de supermercado, papéis, embalagens vazias, entre outros detritos, podiam ser vistos da rua, desconhecendo-se se haveria mais lixo no adro.
Imagem e sino furtados
Desconhece-se se, atualmente, a presença dos intrusos se limita ao adro da capela, como aconteceu já no passado.
Uma moradora ouvida pelo JM disse que a presença de toxicodependentes na zona é frequente. Relata situações de invasão de outras propriedades privadas e cenários degradantes de indivíduos que se drogam junto às casas e até junto ao infantário localizado frente a frente com a capela.
Relativamente à capela, disse à nossa reportagem que é bem possível que eles entrem pela passagem estreita, de tão magros que são, e recorda que o interior já foi assaltado, não sabe precisar quando, nem que tipo de bens foram furtados.
Sobre os furtos ocorridos no passado, uma outra fonte concretizou dizendo que a imagem de Nossa Senhora da Nazaré “foi levada e nunca mais se soube dela”, assim como o sino.
Imóvel de interesse público
A Capela da Nossa Senhora da Nazaré é propriedade privada, estando classificada como imóvel de interesse público desde 1940. Foi sede da paróquia, desde 1961 até à Dedicação da Igreja Paroquial em 2002, e em 1999 deixou de ser ali celebrada a eucaristia dominical, conforme é relatado num blogue dedicado à paróquia. De acordo com a mesma fonte, terá sido doada à diocese, mas o facto é que tal transição não aconteceu e a única informação que temos da parte da diocese é a de que se mantém na posse de uma família.
Sobre a manutenção do edifício, a Direção Regional da Cultura fez saber ao JM que, apesar dos deveres de conservação atribuídos aos proprietários, “a Região tem assumido um papel dianteiro na conservação daquela capela realizando várias empreita
das que têm sido fundamentais para manter a integridade deste edificado do século XVII”.
Adianta a mesma fonte que a Secretaria Regional de Turismo e Cultura, através da Direção Regional da Cultura, está a preparar uma candidatura a fundos comunitários que prevê a conservação e restauro do património azulejar de vários imóveis, na qual se inclui a capela em causa.
“Os proprietários têm conhecimento desta intenção, que aguarda atualmente abertura de aviso para candidatura ao Programa Regional Madeira 20-30”, adianta a DRA.
Intervenções desde os anos 80
Ao longo dos anos, a capela tem vindo a ser intervencionada ao nível de conservação, restauro e beneficiação, em obras da responsabilidade do Governo Regional, nomeadamente através da Direção Regional da Cultura (desde 2015) e anterior Direção Regional dos
Assuntos Culturais.
Recuando aos anos 80 do século passado, em 1988, a Direção Regional dos Assuntos Culturais (DRAC - atualmente Direção Regional da Cultura) procedeu a obras de beneficiação e restauro, incluindo drenagens, impermeabilização do telhado e tetos, cantarias e rebocos; carpintarias; pintura e caiações, arranjos exteriores dos arredores e calcetamento do pavimento; reconstrução da cobertura do alpendre e madeira do forro; instalação elétrica; calcetamento do adro; reforço das portas e janelas; recuperação dos tetos em estuque.
Já em 2011, a ainda DRAC procedeu à reparação, com caráter de urgência, das madeiras e da cobertura do alpendre, que se encontrava em risco de colapso.
Em 2011/2012, também num projeto da DRAC, a Câmara Municipal do Funchal procedeu à beneficiação pontual da capela, procedendo à introdução de um gradeamento, reparação e limpeza da calçada, limpeza do telhado e pintura de paredes.
Esta capela, pelo valor patrimonial e cultural que encerra, foi objeto da primeira iniciativa do projeto de sensibilização patrimonial da SRTC/ DRC intitulado ‘Capelas ao Luar’, em abril de 2016.