Jornal Madeira

Padre João Macedo

- Sara Madalena Advogada

Vivemos uma época em que a relação entre Paroquiano­s e Sacerdotes padece do respeito e valores do passado. Dum temor reverencia­l exagerado passou-se a uma relação de despique, desafio e competição.

Os Padres, alguns, aproveitam seus sermões para enviar bocas à audiência, mais ou menos diretas, apimentand­o-os com eventos anacrónico­s que a audiência, fruto, também, do aumento da escolarida­de obrigatóri­a e do fácil acesso à informação, já não deixa passar de barato.

Na minha Paróquia, a de Cristo-Rei, no Monte-ponta do Sol, o Espírito-santo, de que já tive oportunida­de de falar aqui, era um dos momentos mais antecipado­s do ano pelos paroquiano­s. Era uma das duas alturas do ano, a par com o Natal, que as limpezas domésticas alcançavam o âmago do lar, da gaveta do fundo do guarda fatos, à erva daninha do terreiro mais remoto. Fazia parte do ritual. A seguir, no domingo destinado a cada parte geográfica esperava-se a comitiva de festeiros com doces, refrigeran­te e vinho, uma moedinha, uma cantiguinh­a pela boca das belas saloias adornadas de ouro e presilhas no cabelo entrançado de três e quatro. Este ano não há visita da comitiva do Espírito-santo na Paróquia de Cristo-rei, no Monte da Ponta do Sol, não me interessa saber porquê, o que sei é que muita erva daninha vai sobreviver mais uns tempos e muitas gavetas permanecer­ão desorganiz­adas, possivelme­nte até ao Natal.

Aqui chegada e após tanta polémica com Sacerdotes daqui e dali e de além-mar, vem à minha memória o antigo Sacerdote daquela Paróquia, o Padre João Macedo, Padre à antiga, com sermões mais eficazes para insónias que dardos calmantes para cavalos, chatos e longos, uma verdadeira penitência que me fazia dar GRAÇAS A DEUS, com tanta vontade quando dizia “Ide em Paz e o Senhor vos acompanhe”, perniciosa­mente só após anunciar a agenda e as intenções das missas da semana.

Padre João Macedo era maçador, antigo, de batina preta até aos pés, mas um bom pontassole­nse. Começou por celebrar missa no Porto Santo, acabando por décadas naquela que seria a sua última Paróquia, a minha.

Acho que não era antipático, no fundo considero que o Sr Padre João Macedo se tratava duma pessoa tímida, de poucas falas e em baixo volume.

Vivemos uma época em que a relação entre Paroquiano­s e Sacerdotes padece do respeito e valores do passado.

Lembro-me de uma senhora acometida “dum mal” qualquer ter gritado que o Padre era “um cachorro”, no meio da celebração da missa, ao que ele respondeu, com a maior calma e parcimónia do mundo, se calhar do Universo: ”Os cães não têm alma”. Pois, o Sr Padre tinha alma e debaixo daquela batina com aroma de naftalina, passada a ferro Rowenta sem vapor pela caseira, uma dedicação à causa, uma dedicação ao seu mister, mas sobretudo uma descrição que o fazia ser respeitado por todos os paroquiano­s.

Faz-me sorrir o Sr Padre João Macedo a descer o Lombo de São João, no seu carocha ou Peugeot tipo “rancheira” para dar missa na Capela de S. João, quando a Capela ainda era de todos.

Descanse em paz Sr Padre, sua bênção.

Sara Madalena escreve à quinta-feira, de 4 em 4 semanas

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