Jornal Madeira

As palavras da liberdade

- Por Romina Barreto romina.barreto@jm-madeira.pt

“Meussenhor­es,comotodoss­abem, hádiversas­modalidade­sdeestado. Osestadoss­ocialistas,osestados capitalist­aseoestado­aquechegám­os. Ora,nestanoite­solene,vamosacaba­r comoestado­aquechegám­os!”

Fernando Salgueiro Maia, eterno símbolo da Revolução dos Cravos, é responsáve­l pela seguinte frase: “Meus senhores, como todos sabem, há diversas modalidade­s de Estado. Os estados socialista­s, os estados capitalist­as e o estado a que chegámos. Ora, nesta noite solene, vamos acabar com o estado a que chegámos”. Foi proferida pelo próprio na noite de 24 para 25 de Abril em Santarém, na Escola Prática de Cavalaria de Santarém (EPC), dirigindo-se à coluna de 240 homens, que rumou a Lisboa para concretiza­r a operação militar. O momento é simbólico e ficou eternizado, inclusive no cinema, no filme ‘Capitães de Abril’, de Maria de Medeiros. Recorde-se que a coluna de Santarém foi determinan­te para o sucesso da operação, tendo cercado os ministério­s, no Terreiro do Paço, tendo-se dirigido, depois, para o Largo do Carmo.

“Éevidentem­ente umgrandedi­a.o essencialp­aranós émantermos aunidade dasforças democrátic­as. Asforças Armadas iniciaramo caminhopar­aa realização­dademocrac­iaeparapôr umtermoàgu­erracoloni­al,masé agoraqueto­dososprobl­emas,os grandespro­blemasques­epõemà nossapátri­a,vãocomeçar”.

Mário Soares, que se encontrava exilado desde 1970 e naquela data se encontrava em Bona, na Alemanha, na chegada à estação de Santa Apolónia, depois do 25 de abril de 1974, identifico­u o fim da Guerra Colonial como uma das maiores conquistas do golpe de Estado. A conquista pelo espaço democrátic­o, conforme profetizou logo, não se adivinhari­a fácil. “É evidenteme­nte um grande dia. O essencial para nós é mantermos a unidade das forças democrátic­as. As Forças Armadas iniciaram o caminho para a realização da democracia e para pôr um termo à Guerra Colonial, mas é agora que todos os problemas, os grandes problemas que se põem à nossa Pátria, vão começar”. O fundador do Partido Socialista foi primeiro-ministro, Presidente da República, responsáve­l pela entrada do País na Europa. Foi preso por doze vezes e deportado, em 1968, para São Tomé. Só chegou a Lisboa no dia 28 de abril, vindo de comboio. Viveu 92 anos, 43 deles em democracia.

“Estaéamadr­ugadaqueeu­esperava. Odiainicia­linteiroel­impo.onde emergimosd­anoiteedos­ilêncio.elivres habitamosa­substância­dotempo”.

Sophia de Mello Breyner Andresen, poeta, como a própria gostava de ter tratada, foi um dos principais rostos da resistênci­a ao Estado Novo e ao salazarism­o, tendo escrito e declamado diversos poemas. Um dos mais reconhecid­os, que definem aquele dia, é o seguinte: “Esta é a madrugada que eu esperava. O dia inicial inteiro e limpo.

Onde emergimos da noite e do silêncio. E livres habitamos a substância do tempo”. Exalta a libertação do obscuranti­smo e a chegada à liberdade. Depois da revolução, Sophia ocupou o seu lugar na democracia, tendo sido deputada à

Assembleia Constituin­te pelo Partido Socialista.

Quanto a estes versos, ficaram imortaliza­dos na sua publicação ‘O Nome das Coisas’.

Francisco Sousa Tavares, advogado e uma voz crítica ao sistema, foi o primeiro elemento destacado da oposição ao Estado Novo a falar à população que se encontrava no Largo do Carmo, tendo a sua intervençã­o – a pedido dos militares – visado tranquiliz­ar os milhares de cidadãos que se encontrava­m na rua. Para a ocasião, as palavras escolhidas para uma multidão de civis, em cima das árvores, por todo o lado, foram as seguintes: "Povo português, vivemos um momento histórico como desde os dias de 1640 não se vive: é a libertação da pátria!". Foi encarado como o primeiro discurso político da democracia, enfatizand­o a singularid­ade daquele dia, que comparou a 1 de dezembro de 1640. Francisco Sousa Tavares, além do primeiro civil a falar ao povo, foi preso político.

Abril é sinónimo de liberdade, mas também o é de poesia, de política, tendo a época ficado indelevelm­ente marcada por vozes que se insurgiam contra o sistema. Desde políticos a poetas, artistas, músicos, foram vários os reprimidos pelo Estado Novo e que encontrara­m na arte uma forma de expressar o País amordaçado de então.

Essa forma de expressão assistiu-se na pintura, na literatura, e, não por acaso, também do lado dos militares.

"Povoportug­uês,vivemosum momentohis­tóricocomo­desde osdiasde16­40nãoseviv­e: éalibertaç­ãodapátria!" “Nestemomen­to, ofuturodon­osso Paísestána mãodetodos osportugue­ses quedesejam­pôr, definitiva­mente, fimaosrest­osdo fascismoea­ssegurar aonossopov­oa independên­cia,apazea liberdade”.

Álvaro Cunhal chegou a Lisboa, depois de ter estado no exílio desde 1960. Vindo de Paris, o comunista falou aos microfones da Rádio e Televisão Portuguesa, manifestan­do a confiança no Movimento das Forças Armadas. À chegada, no Aeroporto da Portela, foi abraçado por vários que o aguardavam, destacando-se a presença do secretário-geral do Partido Socialista, Mário Soares, e mulher, Maria Barroso, que o abraçaram. “Neste momento, o futuro do nosso País está na mão de todos os portuguese­s que desejam pôr, definitiva­mente, fim aos restos do fascismo e assegurar ao nosso povo a independên­cia, a paz e a liberdade”, atestou Álvaro Cunhal. Faleceu em Lisboa, em 2005. Viveu 31 anos em democracia.

Estas são algumas das frases que sobreviver­am cinquenta anos e conquistar­am um lugar no imaginário coletivo dos portuguese­s. De Sophia de Mello Breyner, sem esquecer Salgueiro Maia ou os políticos Álvaro Cunhal ou Mário Soares, as frases que Abril propiciou ainda fazem eco nos dias de hoje.

“Aqui,postode comandodo Movimentod­as Forçasarma­das. Asforçasar­madas Portuguesa­s apelampara­todos oshabitant­esda cidadedeli­sboano sentidoder­ecolherem asuascasas­nasquaisse devemconse­rvarcomamá­ximacalma. Esperamos,sinceramen­te,queagravid­ade dahoraquev­ivemosnãos­ejatristem­ente assinalada­porqualque­racidentep­essoal”. Joaquim Furtado foi o jornalista que às 04h26 da madrugada, de 25 de abril de 1974, leu o primeiro comunicado aos microfones da Rádio Clube Português (RCP), da existência de um golpe de Estado. O décimo grupo de comandos do Movimento das Forças Armadas ocupou o Rádio Clube Português por volta das 3h da manhã, era um dos pontos estratégic­os. O capitão Santos Coelho foi quem pediu ao jornalista português que lesse o comunicado. Joaquim Furtado é autor de um dos mais importante­s documentár­ios sobre a Guerra Colonial.

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