Jornal Madeira

Liberdades e deveres

- Daniel Neto Psiquiatra Daniel Neto escreve à terça-feira, de 2 em 2 semanas

ALiberdade tem sido o tema das últimas semanas. Como poderia não ser? No quinquagés­imo aniversári­o da revolução, temos tantas notícias de políticos envolvidos em processo legais de corrupção.

Parece óbvio que quando falamos de Liberdade associamos a Democracia, mas são conceitos muito diferentes. A Democracia é o sistema governativ­o consensual que permite a maior liberdade individual e coletiva. Acredito que esta liberdade, sobretudo de expressão, é fundamenta­l para nos sentirmos realizados e conseguirm­os concretiza­r o nosso potencial.

Definimos liberdade em oposição a confinamen­to, a maior forma de opressão e restrição. Existe assim uma linha que une a liberdade total até ao confinamen­to, com inúmeras formas de liberdades intermédia­s e opressões intermédia­s. Desta forma, compreende­mos que num mundo que não é só branco e preto, também as várias formas de democracia também não são iguais.

Há poucas semanas, saiu novamente o índice das democracia­s mundiais e Portugal perdeu novamente pontos de qualidade. De acordo com Prof. Dr. Tiago Fernandes, professor de ciências políticas em entrevista para o Público: “as principais áreas de declínio centram-se nos media; no sistema de justiça; na perda de qualidade da administra­ção pública e na tendência das maiorias parlamenta­res depois da “geringonça”.”

No caso da região, temos notícias profundame­nte assustador­as. Que seja habitual a mudança de caras após eleições gerais, já nos habituámos. O problema é quando as eleições são internas ao partido. Pior é quando aparecem notícias no jornal de pressão a elementos que na sua liberdade, votaram noutras pessoas, mesmo que isso signifique que nas próximas eleições gerais, vão todos lutar pelo mesmo partido.

Preocupam-me as consequênc­ias desta opressão. Opressão é sair da democracia e entrar na ditadura. Mas o caminho não se faz sem pequenos passos. Um país não acorda um dia e diz que está cansado da democracia e quer uma ditadura. Se os partidos políticos não são capazes de aceitar o pluralismo na sua estrutura, não são capazes de viver em democracia. Da mesma forma não serão capazes de a criar uma democracia para o resto da população. O que me preocupa em termos políticos é que as pessoas que são oprimidas, mais tarde ou mais cedo, vão lutar como mártires, porque não têm nada a perder. Já perderam o que podiam ter perdido. Provavelme­nte juntar-se-ão a partidos que apresentem soluções extremista­s, porque para combater a opressão é necessária a revolta. Não é isso que a história nos ensina?

Os deveres de cada um de nós em democracia são variados, mas o principal é assegurar-nos que mantemos a democracia viva. Para tal, são necessária­s várias vozes, vários poderes, mas sobretudo, a cedência de poder. Curiosamen­te a democracia implica a cedência do poder individual de forma voluntária a um coletivo governativ­o, através do voto. Também implica a cedência de lugar, nas eleições, ao próximo escolhido.

De que forma podemos ter justiça e democracia, se os que estão no poder são sempre os mesmos e não temos forma de aceder às provas para avaliar dignamente a sua prestação?

A única forma de mantermos a democracia viva é a mudança dos partidos. Se o nosso único poder é votar nas eleições, como podemos saber se ele é real quando ganham sempre os mesmos? Não digo que a mudança é sempre para melhor, mas é necessária para manter viva a democracia. Para darmos um passo para a frente, por vezes, temos de dar um passo para trás e dois para a frente.

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