Os homens têm os mesmos problemas das mulheres?
Está na hora de dar voz (e corpo) aos problemas dos homens. Se pensa que os stresses delas não o atingem, leia isto...
Muito se tem falado em corpos reais numa luta quase incessante contra corpos perfeitos. Mas isto não é apenas uma questão feminina. Na verdade, eles também sofrem com os ‘problemas’ delas – e com os problemas deles que teimamos em não valorizar.
“Sejamos morais. Vamos contemplar a existência”.
—Charles Dickens
OO corpo masculino é tão complexo quanto o feminino. Usa a puberdade como trampolim para se desenvolver, alimenta-se de hormonas para se transformar e recorre à comida como combustível para sobreviver. Mesmo assim, elas dizem dizer ter mais ‘dramas’ corporais do que eles. Mas isso não é verdade.
Apesar de muito se falar da autoestima das mulheres e do quão impactantes os ideais de beleza podem ser para elas, a imagem corporal tem também “um enorme impacto no bem-estar e saúde mental dos homens”, começa por explicar à Men’s Health a psicóloga Rita Torres.
“Estudos recentes apontam que os homens têm tantas dificuldades com a imagem corporal e autoestima como as mulheres. Por exemplo, um estudo levado a cabo por investigadores da Universidade de Washington [nos Estados Unidos], revelou que uma amostra de alunos universitários valorizava negativamente a falta de cabelo ou de um corpo pouco musculado na sua aparência. Este estudo revelou também que estes alunos experienciavam ansiedade relativamente à sua imagem corporal, o que, muitas vezes, os levava a incorrer em diversos comportamentos de risco, como exercício excessivo, dietas restritivas ou uso de laxantes”, revela a psicóloga, salientando que, “noutro estudo, os resultados apontavam que a interiorização dos padrões de beleza masculinos levavam
OS PADRÕES DE BELEZA MASCULINOS TAMBÉM EXISTEM E HÁ MUITO QUE ESTÃO ENRAIZADOS
a que uma amostra de adolescentes norte-americanos apresentasse maiores índices de sintomatologia depressiva”.
A saúde mental masculina é tão vulnerável ao que acreditamos ser belo como a saúde mental feminina, pois “existe uma pressão social para um ideal de beleza que também afeta os homens, embora ainda seja menos falado. Quer-se que os homens não sejam demasiado magros, mas também não demasiado gordos, que sejam altos, de cabelo farto e ombros largos”.
Mas o impacto do corpo perfeito masculino vai muito além da tristeza em não consegui-lo. Para a também sexóloga Rita Torres, “quando os fatores socioculturais se juntam a fatores psicológicos, como a existência de uma baixa autoestima ou a existência prévia de dificuldades emocionais, é fácil que os homens desenvolvam psicopatologia, como é o caso da sintomatologia depressiva e ansiosa, perturbações alimentares, dismorfismo corporal, abuso de substâncias ou disfunções sexuais. No caso dos adolescentes, esta pressão para ter o corpo perfeito é particularmente perigosa, já que esta é uma fase do ciclo vital em que a necessidade de pertença é muito grande, e existe maior risco de querer alcançar a todo o custo o corpo ‘perfeito’”.
A PRESSÃO TAMBÉM ESTÁ DO LADO DELES
Tal como acontece com o sexo feminino, os homens são igualmente “bombardeados com a imagem de um corpo ideal, de acordo com os cânones da sociedade”. A diferença é que há vozes na luta por um #realbody feminino, mas a luta por um corpo real masculino mantém-se silenciosa… e muito por culpa não só da sociedade, mas também do próprio homem - que teima em fazer jus à teoria de que o homem deve ser valente.
Ao contrário da realidade das mulheres, continua a especialista, os homens “têm poucos recursos para os ajudar a lidar com uma imagem corporal negativa”. E os padrões de beleza há muito enraizados são imensos: Corpos esbeltos, músculos tonificados, ombros largos, peito depilado, barba farta, cabelo vasto, sorriso perfeito.
Sim, os homens também sofrem com padrões socialmente predefinidos e “existe ainda uma pressão social para que sejam ‘fortes’ e, portanto, ainda não lhe és permitido expressar emoções associadas a qualquer tipo de vulnerabilidade, como é o caso da tristeza”. Afinal, o que ainda se ensina aos mais novos é que ‘os homens não choram’ – não é verdade? – e “é por isto que facilmente se percebe o desconforto dos homens em falar de assuntos como a sua imagem corporal ou autoestima”, continua a especialista.
Segundo a psicóloga Rita Torres, além dos problemas delas poderem afetar os homens, nos dias de hoje “parece que é obrigatório para se ser desejável que o homem não exiba caraterísticas associadas às mulheres, como estrias, celulite, maminhas, falta de pelos”.
Neste ponto, salvaguarda a especialista, “é importante referir que o conceito de género estabelecido pela sociedade atual é bastante tirano ao colocar o homem e a mulher em ‘caixinhas’. Ser mulher ou homem é muito mais do que as suas caraterísticas físicas. Existem mulheres com as mais variadas caraterísticas físicas, assim como homens, e isso não tem necessariamente nada a ver com o género. Por exemplo, no caso das mulheres que têm seios pequenos não as vamos achar menos mulheres por isso, pois não? Porque é que no caso dos homens, eles serão menos homens se tiverem maminhas?”.
DRAMAS CORPORAIS ALÉM GÉNERO
Celulite, estrias, maminhas grandes. Três características do corpo humano. Três características que involuntariamente associamos às mulheres. Mas estas são três características que também afetam os homens e que provam que o corpo é muito mais do que o género.
Tal como acontece no corpo da mulher, “a celulite ou ‘pele em casca de laranja’ não é uma doença e resulta da deposição de gordura nas células adiposas nos fascículos de tecido conjuntivo perpendicularmente à pele. É bastante mais rara nos homens do que nas mulheres, pois o ambiente hormonal masculino é rico em testosterona e pobre em estrogénio, o que faz com que nos homens haja mais suporte do tecido conjuntivo e menos tendência à deposição de gordura nas coxas e nádegas, os pontos críticos para a celulite na mulher”, explica à a dermatologista Ana Nogueira.
No que diz respeito às estrias, continua a especialista, estas “acontecem também nos homens, sobretudo nos picos de crescimento e com variações de peso”. Apesar de o corpo masculino não estar imune a estas marcas corporais, os homens estão em vantagem, pois não engravidam, “o que naturalmente os protege de muitas estrias”.
Além destas duas características corporais, os homens podem ainda apresentar maminhas maiores do que o desejado. Segundo Ana Nogueira, “a ginecomastia corresponde a um aumento do volume mamário, normalmente bilateral, pelo aumento do componente glandular da mama”, condição que “ocorre com alguma frequência na puberdade por uma desregulação hormonal transitória mas que resolve espontaneamente na maioria dos casos”.
No caso dos homens adultos, salienta, “é importante recorrer ao médico para excluir algumas doenças que originem aumento de estrogénios circulantes, como insuficiência hepática, doenças hormonais ou tumores testiculares, bem como aferir a medicação que tomam. Identificando a causa, conseguem-se resolver muitos casos, mas existe a possibilidade de tomar medicamentos ou eventualmente fazer uma cirurgia para reduzir o volume mamário”.