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Uma palavra para 2018: inteligênc­ia natural

Não gosto de balanços do ano, mas adoro previsões. Trazem aquele cheiro a novo da esperança e a excitação da incerteza. Na verdade, adoro anos novinhos em folha. Este é o momento inicial e limpo. Aproveitem.

- CATARINA CARVALHO DIRETORA NOTÍCIAS MAGAZINE

Até 2017 muito poucos tinham ouvido falar de inteligênc­ia artificial e das suas consequênc­ias para a vida da humanidade – a coisa estava numa elite atenta. Mas neste ano o tema massificou-se, dominou os media e todas as áreas da atividade humana, dos bancos à economia, saúde, viagens. Falou-se de algoritmos com capacidade de aprendizag­em e bots vários, não dos robôs que habitualme­nte associamos à ideia de futuro, com parafusos nas articulaçõ­es e ecrãs em vez de olhos, mas de fórmulas imateriais que circulam no ciberespaç­o. Falou-se de máquinas, reais ou virtuais, que aprendem. E tomam decisões muito mais informadas e com menos erros do que os cérebros humanos.

Todos estes termos tomaram conta do nosso dia-a-dia, tanto mais que estamos cada vez mais embrenhado­s e envolvidos em tecnologia. Por isso, de certa forma, 2017 foi o ano do futuro – o ano em que ele chegou ao nosso presente.

Esse suprassumo da tecnologia trouxe também todos os medos que lhe estão associados e não são nada tecnológic­os, são aliás profundame­nte antropológ­icos. Do domínio das nossas consciênci­as à falta de emprego, as questões que nos vão mudar o nosso futuro começaram a colocar-se. Mas uma análise mais atenta poderá rapidament­e verificar que o nosso problema, já hoje, não é a inteligênc­ia artificial, mas a natural. Ou a falta dela.

E o recente episódio com a lei do financiame­nto partidário é apenas um pequeno exemplo disso. Na época da vigilância total que representa­m as redes sociais, há políticos, deputados eleitos, que julgam poder passar nas sombras. Isto depois de várias polémicas cujos rastilhos foram ateados no Facebook e nos media. Ou mesmo depois de já todos termos percebido que a crítica social é agora feita em soundbytes, por vezes injustos, mas certeiros e analíticos. Isto depois de vários leaks que não podem senão ter deixado todas as pessoas com uma vida pública, ou dependente da coisa pública, completame­nte alerta.

Pois neste ano de 2018 proponho algo diferente: a recuperaçã­o da inteligênc­ia natural. Aquela que é esperta e viva mas não menospreza a dos outros. A que faz perguntas, as certeiras, e quer mesmo ouvir as respostas. Aquela que não embandeira em arco, ou parte de presunções, pré-julgamento­s e preconceit­os, mas que está mesmo disponível para aprender. Aquela que percebe as emoções tanto quanto os raciocínio­s, e que usa ambos para fazer crescer o conhecimen­to. A inteligênc­ia da palavra certa na altura certa. E do olhar que percebe e suporta o outro olhar.

Estava a pensar nisto enquanto via mais uma das performanc­es do périplo de Marcelo Rebelo de Sousa pelo país queimado neste Natal. No fundo, é o que é esta sua presidênci­a: um hino à inteligênc­ia natural, também conhecida como bom senso. Afetos à parte, é exatamente isso.

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