“Considero que sou um privi
Paulo Sousa reconhece que tem ideias de treino e trabalho diferentes das que estão enraizadas no futebol italiano, mas valoriza muito a qualidade tática dos treinadores que enfrenta na Serie A
O treinador da Fiorentina admite que continua a haver algum resultadismo no campeonato transalpino. Alguns dos seus jogadores têm referido na Imprensa que tem apresentado metodologias de treino inovadoras e diferentes. Confirma? —O futebol italiano, como sucede noutros países, tem culturas enraizadas, não só de jogo, mas também de trei- no. Por isso, reconheço diferenças. Eu, ao longo dos anos, fui procurando enriquecer o meu conhecimento para optar por uma metodologia de trabalho que, juntamente com o meu staff, nos permita atingir objetivos. Objetivos que passam por enriquecer e melhorar os jogadores com quem trabalhamos, inclusive como pessoas, para depois coletivamente atingirmos as nossas metas. Há diferenças na forma de trabalhar em Itália e noutros países. Em Portugal, por exemplo, existe uma maior variabilidade de metodologias no t r ei no, noutros países as coisas são mais estanques. Daí também a dificuldade em colocar treinadores de outras nacionali- dades em Itália e que se apresentem com ideias diferentes das que estão enraizadas. Por isso, considero que sou um privilegiado, porque estou a mostrar que há várias formas de se ganhar. Depois de treinar três clubes ingleses [QPR, Swansea e Leicester] e passar por Hungria [Videoton], Israel [Maccabi Telavive] e Suíça [Basileia], chegar ao futebol italiano era um objetivo? —Nunca fui, como pessoa ou treinador, alguém de projetar o futuro, no sentido de estabelecer como objetivo treinar num determinado clube ou campeonato. Dito isto, a Itália possui um campeonato que considero muito. É um privilégio poder estar a trabalhar e, sobretudo, a competir contra colegas que têm uma capacidade tática de altíssimo nível e que vão permitirme continuar a evoluir enquanto treinador. Apesar dessa reconhecida capacidade tática, discutese muito o declínio do futebol italiano. Como o explica? —Penso que a grande justificação é o declínio do potencial económico. Sabemos que os clubes que têm maior capacidade económica contratam os melhores jogadores e aumentam as suas possibilidades de vencerem os títulos. Têm maiores percentagens de sucesso. Nem sempre isso acontece, felizmen- te, porque há outros fatores que entram em equação e que condicionam os resultados. Quando o futebol italiano gozava de uma maior capacidade económica, tinha os melhores jogadores e daí t er melhor qualidade no jogo. Encontra grandes diferenças no futebol italiano em relação aos seus tempos de jogador na Serie A? —Mudou a organização dos próprios clubes. Melhoraram. Há uma cultura enraizada que se mantém. Este ano, penso que se notou um passo no sentido de um melhoramento na qualidade.
“Competir contra colegas que têm uma capacidade tática elevada vai permitir-me continuar a evoluir” “Acredito que
mais perto da vitória quando temos o domínio absoluto em todos os momentos do jogo”
ficamos É agora um futebol menos resultadista?
—Esse não me parece que al-
guma vez deixe de existir. Mas com variáveis táticas muito interessantes e protagonizadas por treinadores jovens e menos j ovens. Por exemplo, no jogo contra a Atalanta, competi contra um treinador, Edy Reja, que é o mais velho na Serie A, e que apresentou não só qualidade na sua proposta de jogo, mas que durante a partida mostrou uma capacidade de tomar decisões e uma variabilidade tática de altíssima qualidade. Por isso, o facto de estar a analisar e a viver isso está a enriquecer-me muito. Acha que o futebol italiano não é suficientemente valorizado fora de Itália? —A perceção que existe é que há, sem dúvida, uma ideia de futebol resultadista, em que se pretende vencer com o mínimo de esforço possível. Ou seja, defendendo bem e contra-atacando bem chega-se ao resultado. Esta não é a base da minha ideia ou essência de futebol. Acredito que ficamos mais perto da vitória quando temos um domínio absoluto em todos os momentos de jogo, nomeadamente quando temos um predomínio no controlo do jogo com bola. No entanto, há várias formas de se ganhar uma partida. E é isso que os treinadores italianos me têm demonstrado este ano, não só pela qualidade de integração de jogadores como pelas variabilidades táticas apresentadas.