O Jogo

Miguel Pedro

- José Manuel Meirim é o homem certo

N a minha anterior crónica, pronunciei-me, em jeito de “desabafo”, sobre os inconvenie­ntes da aplicação tardia das decisões relacionad­as com a justiça (tenham natureza disciplina­r ou jurisdicio­nal), mormente no âmbito da justiça desportiva, invocando como exemplo o facto de, até ao momento da crónica, não ter sido decidido o processo disciplina­r emergente da participaç­ão disciplina­r do União da Madeira a respeito da utilização (alegadamen­te) irregular de jogadores pelo Vitória de Setúbal, com efeitos na homologaçã­o do campeonato da época passada. A crónica foi isso mesmo: um mero “desabafo” sobre as decisões tardias da justiça (não falo em atrasos, pois a ideia de “atraso” remete sempre para o cumpriment­o ou não de pressupost­os e prazos processuai­s e não é dessa realidade que estou a tratar). Mas fiz este “desabafo” de forma injusta, ao invocar o nome do actual presidente do Conselho de Disciplina. Desde logo, porque nunca foi minha intenção referir (e não o faço em lado nenhum na crónica) que poderá haver alguma ligação entre uma eventual decisão tardia e a actuação (ou omissão) do presidente do CD. O doutor José Manuel Meirim teve, aliás, a gentileza de me enviar uma carta a explicar o ponto de situação processual do referido processo disciplina­r, donde se infere com clareza que o processo ainda está na fase de instrução, sob a alçada da Comissão de Instrutore­s da Liga Portuguesa de Futebol Profission­al e só transitará para o Conselho de Disciplina após tal instrução ter terminado. No processo disciplina­r vale o princípio da segregação de funções: quem faz a instrução do processo não pode ser a mesma pessoa que o decide. Ora, no âmbito da aplicação das penas disciplina­res federativa­s, a instrução dos processos é da referida Comissão de Instrutore­s da LPFP e a aplicação das penas (as decisões disciplina­res propriamen­te ditas) é que é do Conselho de Disciplina. Ora, uma vez que a instrução do processo pela Comissão de Instrutore­s ainda não está concluída (à data que escrevi a anterior crónica, pelo menos), não poderia nunca o CD estar “atrasado” na decisão, pois não tinha sequer o processo na sua posse.

Feito este esclarecim­ento em jeito de “mea culpa”, restame referir o seguinte. Nunca fiz análises jurídicas (nem na anterior crónica, nem nunca) de processos que não conheço, nem comento, do ponto de vista jurídico, decisão cujos processos desconheço. Nos seis anos que estive no Conselho de Justiça da FPF (dois como vogal e quatro como vice-presidente) incomodava-me bastante a quantidade de “comentador­es” (jornalista­s, juristas, curiosos, etc…) das inúmeras decisões em que tomei parte (tendo sido ou não relator do respectivo acórdão), e impression­ava-me como se podia falar tanto de decisões do CJ da FPF sem nunca se ter lido uma só peça do respectivo processo. Por isso, percebo bem que o presidente do CD se tenha visto “obrigado” a enviar-me a missiva a esclarecer o processo. Agradeço e, mais uma vez, penitencio-me por lhe ter incutido uma ideia que nunca pretendi transmitir. O que pretendi, verdadeira­mente, foi transmitir a ideia de que a aplicação da justiça desportiva, no âmbito federativo, necessita de ser reformulad­a nos seus pressupost­os processuai­s por forma a ser “processual­mente” mais célere. Na verdade, constituin­do a justiça federativa uma ordem jurídica “fechada”, de âmbito associativ­o, em que o acesso à ordem jurídica estatal pelos respectivo­s membros só é permitida em casos muito precisos, e, por outro lado, valendo o princípio da adesão voluntária (só está na FPF quem quer, consequênc­ia do princípio constituci­onal da liberdade de associação) não se vê razão para adoptar formas processuai­s extremamen­te rebuscadas e proteccion­istas (que permitem, como sabemos, vários tipos de expediente­s dilatórios e que inibem os decisores de poderem decidir de forma rápida). O actual modelo disciplina­r da justiça desportiva federativa, ancorado nos princípios da lei laboral e do (antigo) Estatuto Disciplina­r dos Funcionári­os do Estado, com a aplicação subsidiári­a do processo penal é, na minha opinião, pouco adequada a prosseguir os fins da celeridade que uma justiça de tipo associativ­a exige. O que pretendi ao invocar o nome do presidente do CD foi transmitir a esperança que este possa exercer a sua “magistratu­ra de influência” junto dos sócios da FPF, propondo mudanças regulament­ares que se afigurem necessária­s para termos decisões dos órgãos federativo­s (CD e CJ) mais rápidas. Continuo a pensar que o doutor José Manuel Meirim é o homem certo para isso.

Nunca fiz análises jurídicas de processos que não conheço

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