“Dificuldade de Angola é trabalhar os talentos”
Diretor executivo da Federação Angolana de Futebol alerta para os problemas que os clubes enfrentam para fazer emergir os jovens futebolistas
Dirigente fala em medidas sérias para devolver ao país o protagonismo de outros tempos no desporto. A receita parece simples: os clubes têm de investir mais em infraestruturas e a federação em quadros
O talento do futebolista angolano estará durante dois dias em discussão em Luanda. O II Congresso do Futebol em Angola tem início hoje na capital angolana e termina amanhã. O JOGO é um dos parceiros desta iniciativa, que tem como objetivo contribuir para a evolução do futebol naquele país.
Em entrevista a O JOGO, Dino Paulo, diretor executivo da Federação Angolana de Futebol (FAF), fala sobre o evento e traça o atual panorama do futebol angolano.
O Congresso é uma forma de mostrar ao mundo que há jogadores talentosos em Angola? — O evento serve, sobretudo, para chamar a atenção dos agentes desportivos para a importância do scouting na evolução e organização dos próprios clubes. Dar uma visão mais económica do que pode ser a valorização dos atletas. O congresso serve para discutir e perceber de forma ampla como é que o processo de Angola está a ser implementado e conhecer as várias experiências pelo mundo, que podem ajudar a nossa realidade. Mas há, ou não, talentos em Angola? — Há talentos em Angola. O grande problema, no entanto, não é a existência de talentos, é trabalhar esses talentos. Que mecanismos estão a ser postos em prática para resolver esse problema?
— A primeira coisa a fazer é um
“Infelizmente, muitos dos treinadores que estão na formação não têm a qualidade necessária para treinar” “Há futebolistas estrangeiros que deixam muito a desejar”
diagnósticosobreonossonível desportivo atual. Como é que osclubesestãoorganizadosem termos de infraestruturas e de capital humano. Depois, a federação tem de programar um plano de formação para treinadores, preparadores físicos e analistas de rendimento. Por fim, desenvolver um quadro competitivo nas camadas de formação para que os jogadores consigam despontar e atingir um nível elevado. Ao mesmo tempo, é preciso expô-los a nível internacional. Desde logo, através das seleções nacionais e até dos próprios clubes, com a participação em torneios internacionais. Dito dessa forma até parece um processo simples... — Não é um processo simples. Os clubes têm de criar infraestruturas. Se os clubes não se preocuparem em ter infraestruturas de base para que estes talentostrabalhem,vamoster dificuldades. Outro aspeto, são os quadros. Infelizmente, muitos dos treinadores que estão na formação não têm a qualidade necessária para treinar. A federação criou medidas protecionistas para os jovens talentos que vão surgindo? — Sim, uma delas é não limitar a inscrição de jogadores até aos 21 anos. No mesmo sentido, exigir que no plantel tenham um número mínimo de jogadores até aos 21 anos, precisamente para dar projeção a esses miúdos. A nível de exposição externa, participar nas diversas competições pela seleção, tanto as oficiais como as amigáveis. Fala-se muito nos jogadores angolanos. Há espaço para jogadores estrangeiros em Angola? — O mundo é global, não podemos pensar que só quere-
mos ter aqui jogadores angolanos. Queremos jogadores estrangeiros, mas aqueles que venham melhorar aquilo que é o nosso campeonato. Que venham aqueles que acrescentam valor.
Mas há limitações para a incorporação desses jogadores nas equipas?
— Sim, os plantéis podem ter até cinco jogadores estrangeiros. Há estrangeiros muito bons, mas também há os que deixam muito a desejar, queremos ser mais exigentes nesse aspeto. Há situações em que os angolanos poderiam fazer melhor.
É aliciante financeiramente para um jovem ou um estrangeiro jogar em Angola. Conseguem ser profissionais?
—Apesar de estarmos num contexto de crise, que é sempre importante frisar, hoje os salários são superiores àquilo que eram há dez anos. Na maior parte das equipas, o salário mínimo na primeira divisão, até há um ano, era o equivalente a mil dólares [cerca de 860 euros]. Em qualquer parte do mundo, para um miúdo quesa ida formaçãoé um ordenado atraente. Também há juniores que já ganham cinco a dez mil dólares. Mas o dinheiro está na Europa, eé aí que conseguem fazer uma vida profissional mais condigna.
Qual é o ordenado máximo praticado no Girabola?
—Hoje não tenho bem noção. Mas na altura em que esteve cá o Rivaldo [jogou no Kabuscorp] dizia-se que ele ganhava quase um milhão de dólares por ano. Mas esses também são casos excecionais. Atualmente, os salários andam entre os mil e os vinte mil dólares [pouco mais de 17 mil euros], não mais do que isso.
“Ganhar mil dólares é, para qualquer miúdo, um ordenado atraente” “Os salários [no Girabola], atualmente, andam entre os mil e os vinte mil dólares, não mais do que isso” “Dizia-se que o Rivaldo ganhava quase um milhão de dólares por ano”
Dino Paulo Diretor executivo da FAF