O Jogo

Quando o frio nas aulas é igual ao da rua

Treinador faz uma viagem pelo interior, que sofre com as desigualda­des de um país com duas caras por falta de vontade política

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Natural de Vila Real, Luís Castro conhece bem os problemas do interior, convive com as desigualda­des e não tem dúvidas de que falta vontade política para alterar este estado de coisas

Chaves é uma cidade do interior e uma vítima de um país cheio de desigualda­des. Luís Castro, até por ser transmonta­no, conhece bem o problema e fala dele abertament­e.

Chaves continua a viver os problemas de uma cidade do interior. De alguma forma, você tem abordado a questão...

—Vive, viveu e viverá. Somos um país de contrastes, somos um país a duas velocidade­s, somos um país que não dá as mesmas oportunida­des ao interior que dá ao litoral, portanto isso é uma coisa muito difícil de ultrapassa­r. É algo que está ao alcance do poder político, não está ao alcance de nós que habitamos aqui. Quem vive em grandes cidades do litoral e chega a Chaves, sente que há qualquer coisa que não bate certo, mas isso parte da sensibilid­ade que os políticos têm de ter. A mim, enquanto cidadão, preocupa-me muito mais como estão a saúde e a educação no interior do país do que o futebol; e a saúde e a educação aqui estão muito longe do que aquilo que se passa no litoral.

Sentiu essa influência da interiorid­ade no seu trabalho?

—É algo que se sente. Há diferenças e isso reflete-se em tudo no dia a dia. Eu sou transmonta­no e posso dizê-lo de forma clara – é uma vida mais sofrida. Quando dentro de casa está a mesma temperatur­a que está fora de casa; quando para se fazer uma sessão de químio tem de se percorrer cem quilómetro­s, está tudo dito; quando os meninos vão para a escola e a temperatur­a dentro das salas está quase igual à que está fora da escola... É difícil mudar enquanto quem tem o poder de fazer mudanças não olhar de forma mais atenta. Muitas vezes é ridícula a forma como se olha para estas situações.

Hoje chega-se mais depressa a Chaves...

—Mas isso é uma forma de nos enganar. Chega-se mais depressa ao frio, chega-se mais depressa onde não há condições, mas isso oqueé queres olve? Aúnicacoi saque re sul taé no facto de as pessoas encontrare­m esta realidade, seja em Chaves, em Vila Real, em Castelo Branco. Fala-se do turismo no país, mas não se fala do turismo no interior. Concretame­nte Chaves, queéac idade de que estamos a falar, tem potenciali­dades enormes. Associando Chaves ao Douro, acho que são duas marcas que, juntas, podiam ser uma mistura bastante explosiva em temos de desenvolvi­mento da região. Falta a vontade.

Trabalhar na região onde nasceu foi uma das razões que o levaram a aceitar o convite do Chaves?

—Sempre olhei para a minha região de uma forma muito distante. Saí daqui para Leiria muito jovem. A minha mãe era professora, o meu pai militar e foi colocado na base em Monte Real. Vinha aqui passar as férias grandes, o Natal, a Páscoa, e sentia essa diferença de que lhe falei entre o interior e o litoral. Senti aquela vida sofrida; lá em baixo, a vida era mais leve. Tive a oportunida­de de poder contribuir como meu trabalho para o bem da região, sempre na esperança de que as pessoas de Trás-os-Montes gostassem do meu trabalho; esperança em desenvolve­r jogadores, em desenvolve­r uma organizaçã­o cada vez mais sustentada para o clube crescer, porque um clube vai muito para além dos resultados. Foi nessa perspetiva que vim, e também na esperança de ver a região mais envolvida com o clube.

“Quando para se fazer uma sessão de químio tem de se andar cem quilómetro­s...” “Chaves tem potenciali­dades enormes. E ninguém vê isso”

Luís Castro

Treinador

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Um transmonta­no que não esquece (nem podia!) as suas origens

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