CAMPANHÃ TEM OUT RA VIDA
D. PORTUGAL O popular clube portuense está a formar uma Academia. Eduardo Luís, ex-jogador do FC Porto, é a cara do projeto
O Desportivo de Portugal recebe todas as crianças que queiram jogar futebol, nem que não tenham dinheiro para pagar as aulas. Indisciplina era um problema no início, mas está a ser ultrapassado
Há um clube a renascer no coração de Campanhã, freguesia da zona oriental do concelho do Porto. O Desportivo de Portugal, fundado em 1925, estava condenado ao esquecimento, até que há ano e meio Jorge Dias assumiu a presidência. Este renascimento não se faz por uma qualquer subida a um escalão nacional, mas sim pela aposta na formação. Quem, ao final da tarde de todas as terças, quartas e quintas-feiras, entra no Campo Ruy Navega vê uma vitalidade que não era comum e que contrasta com as bancadas erguidas no início do século passado e com o claustrofóbico túnel de acesso ao relvado, marcas de um clube antigo que agora embala para uma nova vida.
No sintético ali colocado em outubro treinam umas boas dezenas de crianças, a maior parte com camisolas do FC Porto vestidas. Na época anterior, o Desportivo só tinha juniores e juvenis, mas agora quer ter todos os escalões. Da amizade entre Jorge Dias e Eduardo Luís, defesa-central campeão europeu pelos dragões em 1987, nasceu a ideia de associar a cara do antigo jogador à recém-formada academia do emblema portuense. O projeto de Jorge Dias e Eduardo Luís não tem interesses económicos e quer, sobretudo, dar oportunidades a todos os jovens desta zona da Invicta, muitos deles provenientes de meios sociais desfavorecidos. “Tenho esta ideia de dar o nome a uma academia há muitos anos. Conheci o Jorge há dois anos, ele fez-me a proposta e aceitei. Não ganho nada com isto, só dou o nome e dá-me gosto ver os ‘putos’ evoluírem”, explica a antiga glória portista. “Muitos miúdos têm grandes dificuldades financeiras, alguns não têm pais e o clube luta para que eles tenham as melhores condições possíveis”, acrescenta.
Para cativar atletas, as mensalidades no Desportivo são baixas ou... não existem. “As crianças pagam entre 10 e 15 euros, valor que dá para a logística, banhos, inscrições ou seguros. A base de treinadores que temos aqui é gente da casa que está a trabalhar de graça. Em agosto quero ter 150 miúdos na Academia”, afirma Jorge Dias. Quando o dirigente entrou no clube onde tinha sido jogador, os casos de indisciplina eram muitos. “Posso dizer que tive miúdos que chegavam ao treino afumarcharr os ”, conta .“Na minha carreira de jogador e treinador nunca fui expulso. Aqui haviain disciplina para com os treinadores, árbitros e até para com o público”, completa Eduardo Luís.
Os casos problemáticos diminuíram drasticamente e passar valores a estas crianças é uma grande preocupação. “Esta ideia é, na sua base, um projeto social. Queremos aproveitar o maior número de miúdos da zona de Campanhã e do Bonfim que não têm possibilidades de jogar. Quando aparecem crianças novas, dizemos aos pais para não virem com a ideia que os filhos vão ser campeões europeus como o Eduardo Luís. Aqui queremos é que respeitem as re-
O Desportivo de Portugal foi fundado em 1925. O clube quer, no próximo ano, juntar equipas de iniciados, infantis e de futebol de sete aos juniores e juvenis
gras”, sublinha Luís Sousa, diretor da formação do Desportivo de Portugal. Por isso, a vitória no campo fica em segundo plano. “Toda a gente quer ganhar, mas a minha principal vitória será dizer que um miúdo está mais disciplinado ou que melhorou na escola, pois é possível conciliar as duas coisas”, explica Luís Sousa.
Ora, todas as semanas têm chegado caras novas ao Campo Ruy Navega e espera-se que, graças a Eduardo Luís, muitas mais cheguem. “O nome do Eduardo é que vai chamar pessoas, não é o nome do Desportivo de Portugal. É como diz o nosso slogan: ‘vem aprender com um campeão europeu’”, atira Jorge Dias. Contudo, só os mais velhos é que conhecem um pouco da carreira do defesa. “Os jogadores mais velhos vão pedindo para lhes contar histórias desse tempo”, relata Eduardo Luís.
Daniel, jogador na casa dos oito anos e adepto do FC Porto, não sabe quem foi Eduardo Luís e fica admirado quando a reportagem de O JOGO lhe diz que o antigo internacional venceu a Taça dos Campeões Europeus. “A sério?”, questiona Daniel. Eduardo puxa da carteira para tirar a fotografia da equipa que conquistou o título europeu em Viena, em 1987.“Omeupaitambémtem essa foto”, diz Daniel, revelando que, em casa, vai dizer ao pai, portista, que esteve a conversar com um ícone do clube. É assim que o Desportivo está a renascer.
“Tenho esta ideia de dar o nome a uma Academia há vários anos. Não ganho nada com isto, só dou o nome”
Eduardo Luís
Ex-jogador “Tive miúdos que chegavam ao treino a fumar charros. O nome do Eduardo é que vai chamar pessoas”
Jorge Dias
Presidente do D. Portugal “A minha principal vitória será dizer que um miúdo está mais disciplinado ou que melhorou na escola”
Luís Sousa
Diretor da formação do D. Portugal