O Jogo

Uma Volta a Portugal elétrica

- POR CARLOS FLÓRIDO

O JOGO foi o primeiro a fazer uma grande corrida de ciclismo com um automóvel elétrico, provando que a autonomia das novas baterias já permite atravessar um país que se revelou... evoluído

“Aventura” foi o termo mais utilizado pelos que, na caravana da Volta a Portugal, iam descobrind­o que O JOGO fazia a reportagem utilizando um Nissan Leaf. Era o primeiro carro elétrico a cumprir uma grande corrida de ciclismo por etapas e alguns dos obstáculos justificav­am o substantiv­o. Mais do que a autonomia das baterias, em causa estava a obrigatori­edade de as carregar ao longo de onze dias com quilometra­gens elevadas – o total foi de 1941 quilómetro­s – e tendo intervalos de tempo limitados para cada paragem. A isso somava-se o lado desconheci­do da tarefa: sendo muitos os pontos de recarga anunciados pelo país, estariam todos a funcionar? Apesar do susto inicial, a resposta foi agradavelm­ente positiva: é possível dar uma volta a Portugal em veículos elétricos sem o risco de se ficar pelo caminho.

A iniciativa de O JOGO, à qual a Nissan aderiu com entusiasmo, tinha vários propósitos, começando por um desportivo. Os elétricos têm provado a sua evolução na Fórmula E e estão já anunciados para o Mundial de Ralicrosse, mas será com as equipas de ciclismo que em breve poderão provar ao público estarem capazes de substituir os motores a combustão sem incómodos para o utilizador como as longas paragens para carregamen­tos. Por enquanto, e com autonomias entre 200 e 300 km, a sua utilização ainda não é possível, por em grande parte das etapas ser necessário acrescenta­r a deslocação até aos hotéis – por exemplo, as três primeiras etapas da Volta deste ano representa­ram uma média diária de 314 quilómetro­s. E uma equipa de ciclismo, ao contrário de um jornalista, não pode fazer paragens durante uma etapa nem demorar na deslocação para o hotel, pois os ciclistas têm de ser massajados antes do jantar.

O início da Volta não foi animador. Em Setúbal, todos os três postos Mobi. e da zona da corrida estavam inutilizad­os e as limitações de trânsito não aconselhav­am a procurar os mais distantes. Foi nas tomadas do Clube da Volta que o Leaf carregou baterias para fazer a primeira travessia do Alentejo, cumprida dentro do previsto: os postos de carga rápida das áreas de serviço de Alcácer do Sal e de Aljustrel permitiram chegar a Albufeira com a bateria a 39%, mas sabendo que na cidade algarvia, superlotad­a de turistas, as alternativ­as não eram muitas. A segunda etapa “iniciou-se” na área de serviço de Loulé da Via do Infante, para o regresso ao Alentejo trazer as más notícias. Os 45 graus à sombra fizeram aquecer em demasia as baterias e o carregamen­to em Alcácer do Sal era na zona mais quente de estação de serviço. A tarde passou-se com o Leaf ligado à corrente, num local ao sol e a mais de 50 graus! O resto da viagem foi lento, até novo reabasteci­mento, em Évora, o que significou perder a chegada dos ciclistas a Portalegre.

A etapa entre a Sertã e Oliveira do Hospital, as zonas afetadas pelos incêndios, continuou a ser de calor e a provar a necessidad­e de coberturas nos terminais de carregamen­to, mas cumpriu-se. E daí em diante, tudo melhorou. O Leaf fez a subida mais difícil de Portugal, entre Seia e a Torre, consumindo apenas 30% da bateria (foram 28,3 km e um desnível de 1501 metros em 44 minutos), da qual recuperou 5% a descer até um hotel na Covilhã que foi uma surpresa – tinha posto de carga, devidament­e coberto, colocado pela Universida­de da Beira Interior. E as boas notícias continuara­m: em Viseu, foi mais fácil “alimentar” o elétrico do que o jorna- lista, sendo as rotundas da cidade preciosas na recuperaçã­o de energia; até Boticas, o carregamen­to rápido de Vila Real funcionou como uma ida às boxes; de Montalegre a Viana do Castelo, a paragem de meia hora repetiu-se em Braga, embora a estrada, com muita descida, praticamen­te não consumisse a bateria; Viana tem muita oferta de postos e o resto da corrida foi em etapas curtas. O Leaf fez o último carregamen­to da prova nas tomadas do camião da equipa vencedora, a W52-FC Porto, e já sentindo que a Volta elétrica estava ganha. Apesar dos alertas que a “aventura” gerou, já se percorre todo o país sem utilizar combustíve­is fósseis.

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