O Jogo

CONTOS DO DRAGÃO

MASSAGISTA ZÉ LUÍS VIVEU POR DENTRO MAIS DE METADE DOS 125 ANOS QUE O FC PORTO COMPLETA NA SEXTA-FEIRA

- BRUNO FILIPE MONTEIRO

Quando Yustrich se esqueceu dosmiúdosn am ala

As lambidelas de Juary e a orelha com bálsamo

As memórias de Mourinho e Conceição

Foi roupeiro e massagista, varreu bancadas e tratou da relva

Fez um pouco de tudo e tem dois Dragões de Ouro em casa e uma estátua na entrada do Museu dos portistas. Foi em Sevilha e em Gelsenkirc­hen que viveu as maiores alegrias com o clube do coração

Ele foi roupeiro, tratou da relva, varreu bancadas e foi massagista. Trabalhou com o futebol, o basquetebo­l, o andebol, o voleibol, o hóquei em patins, o hóquei em campo ou o ciclismo. Viveu o mais longo período de jejum do clube (1959-1978) e o das conquistas internacio­nais no desportore­i. A 4 de outubro, completará 84 anos de vida, 65 dos quais ligados ao FC Porto. Zé Luís é o funcionári­o mais antigo dos dragões e tem bem presente na memória mais de metade dos 125 anos que o clube celebra. “Estive na inauguraçã­o do Estádio das Antas, em 1952, como adepto, e depois vi-o ser demolido”, recorda, em conversa com O JOGO, na qual não deixou nenhum pormenor por contar.

Os primeiros tempos, próprios da década e do período em que vivia o FC Porto, não foram fáceis. “Entrei em 1953 para ganhar um ‘ordenadão’: cinco cêntimos por dia. Éramos pagos à semana, mas estivemos meio ano sem receber. Foi complicado. Comia-se o que se podia. Era sopa ao almoço e ao jantar, acompanhad­a com pão feito da bolota do carvalho ou a grainha das uvas”, recorda, orgulhoso por nunca ter desistido. “Entrava às 8h00 e muitas vezes saía à meia-noite. Transporta­va de bicicleta os equipament­os da Constituiç­ão para a lavandaria que tínhamos nas Antas, limpava e desinfetav­a os balneários, porque apanhava-se algumas doenças nos estrados de madeira, e ainda regava o campo e varria as bancadas”, descreve.

O cancro de Pedroto e a partida a Juary

Foi com José Maria Pedroto que passou a massagista da equipa de futebol a tempo inteiro, mas é de Dorival Yustrich que guarda mais estórias caricatas. “Era um maluco”, atira. “Quando íamos treinar para Santo Tirso, ele chutava a bola para o meio do mato e os jogadores atiravam-se para as silvas para a ir buscar. Saíam de lá a sangrar e com picos”, lembra. “Ele tinha um carro e costumava levar seis ou sete. Alguns iam na mala. Um dia ouvi uns sons de dentro do carro e disse-lhe: ‘Ó mister, estou ali a ouvir umas coisas no carro’. E ele: ‘Os miúdos, esqueci-me dos miúdos’. Eles quase que asfixiavam”, relata, com um sorriso de orelha a orelha.

Memórias de Pedroto não faltam, mas, infelizmen­te para o malogrado treinador, uma sobrepõe-se às restantes. “Fui eu que lhe detetei o cancro”, garante. “Todas as semanas o massajava. E uma vez ele sentiu uma dor esquisita na zona abdominal. Chamámos o dr. Domingos Gomes e no hospital de São João confirmou-se o problema no intestino”, lamenta Zé Luís, que não esteve na primeira conquista internacio­nal dos portistas (Taça dos Clubes Campeões Europeus de 1987), onde tinha em Juary um amigo brincalhão. “Ele tinha o hábito de me dar beijos e de me lamber a orelha. Então decido espalhar bálsamo na orelha. Nunca mais fez aquilo”, graceja.

Em Sevilha (Taça UEFA) e em Gelsenkirc­hen (Liga dos Campeões), contudo, viveu tudo por dentro. “O Mourinho era incrível. Mal o jogo terminava, anunciava logo aos jogadores quem ia jogar no seguinte”, desvenda o portista, que este ano foi alvo de um tributo de Sérgio Conceição. “Não queria ir [à apresentaç­ão], mas ele disse-me: ‘Daqui não sais. Vais entrar connosco’. Foi bom”, reconhece, orgulhoso por ter dois Dragões de Ouro em casa e uma estátua no museu. “Só é pena a cabeça ser maior do que a minha”, dispara, em tom de brincadeir­a, algo que nunca deixou de fazer em 65 dos 125 anos de FC Porto.

1953 entrou no FC Porto em

Ordenado:

por dia... para ganhar cinco cêntimos

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Zé Luís junto a dois dos sete títulos internacio­nais que o FC Porto conquistou

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