CONTOS DO DRAGÃO
MASSAGISTA ZÉ LUÍS VIVEU POR DENTRO MAIS DE METADE DOS 125 ANOS QUE O FC PORTO COMPLETA NA SEXTA-FEIRA
Quando Yustrich se esqueceu dosmiúdosn am ala
As lambidelas de Juary e a orelha com bálsamo
As memórias de Mourinho e Conceição
Foi roupeiro e massagista, varreu bancadas e tratou da relva
Fez um pouco de tudo e tem dois Dragões de Ouro em casa e uma estátua na entrada do Museu dos portistas. Foi em Sevilha e em Gelsenkirchen que viveu as maiores alegrias com o clube do coração
Ele foi roupeiro, tratou da relva, varreu bancadas e foi massagista. Trabalhou com o futebol, o basquetebol, o andebol, o voleibol, o hóquei em patins, o hóquei em campo ou o ciclismo. Viveu o mais longo período de jejum do clube (1959-1978) e o das conquistas internacionais no desportorei. A 4 de outubro, completará 84 anos de vida, 65 dos quais ligados ao FC Porto. Zé Luís é o funcionário mais antigo dos dragões e tem bem presente na memória mais de metade dos 125 anos que o clube celebra. “Estive na inauguração do Estádio das Antas, em 1952, como adepto, e depois vi-o ser demolido”, recorda, em conversa com O JOGO, na qual não deixou nenhum pormenor por contar.
Os primeiros tempos, próprios da década e do período em que vivia o FC Porto, não foram fáceis. “Entrei em 1953 para ganhar um ‘ordenadão’: cinco cêntimos por dia. Éramos pagos à semana, mas estivemos meio ano sem receber. Foi complicado. Comia-se o que se podia. Era sopa ao almoço e ao jantar, acompanhada com pão feito da bolota do carvalho ou a grainha das uvas”, recorda, orgulhoso por nunca ter desistido. “Entrava às 8h00 e muitas vezes saía à meia-noite. Transportava de bicicleta os equipamentos da Constituição para a lavandaria que tínhamos nas Antas, limpava e desinfetava os balneários, porque apanhava-se algumas doenças nos estrados de madeira, e ainda regava o campo e varria as bancadas”, descreve.
O cancro de Pedroto e a partida a Juary
Foi com José Maria Pedroto que passou a massagista da equipa de futebol a tempo inteiro, mas é de Dorival Yustrich que guarda mais estórias caricatas. “Era um maluco”, atira. “Quando íamos treinar para Santo Tirso, ele chutava a bola para o meio do mato e os jogadores atiravam-se para as silvas para a ir buscar. Saíam de lá a sangrar e com picos”, lembra. “Ele tinha um carro e costumava levar seis ou sete. Alguns iam na mala. Um dia ouvi uns sons de dentro do carro e disse-lhe: ‘Ó mister, estou ali a ouvir umas coisas no carro’. E ele: ‘Os miúdos, esqueci-me dos miúdos’. Eles quase que asfixiavam”, relata, com um sorriso de orelha a orelha.
Memórias de Pedroto não faltam, mas, infelizmente para o malogrado treinador, uma sobrepõe-se às restantes. “Fui eu que lhe detetei o cancro”, garante. “Todas as semanas o massajava. E uma vez ele sentiu uma dor esquisita na zona abdominal. Chamámos o dr. Domingos Gomes e no hospital de São João confirmou-se o problema no intestino”, lamenta Zé Luís, que não esteve na primeira conquista internacional dos portistas (Taça dos Clubes Campeões Europeus de 1987), onde tinha em Juary um amigo brincalhão. “Ele tinha o hábito de me dar beijos e de me lamber a orelha. Então decido espalhar bálsamo na orelha. Nunca mais fez aquilo”, graceja.
Em Sevilha (Taça UEFA) e em Gelsenkirchen (Liga dos Campeões), contudo, viveu tudo por dentro. “O Mourinho era incrível. Mal o jogo terminava, anunciava logo aos jogadores quem ia jogar no seguinte”, desvenda o portista, que este ano foi alvo de um tributo de Sérgio Conceição. “Não queria ir [à apresentação], mas ele disse-me: ‘Daqui não sais. Vais entrar connosco’. Foi bom”, reconhece, orgulhoso por ter dois Dragões de Ouro em casa e uma estátua no museu. “Só é pena a cabeça ser maior do que a minha”, dispara, em tom de brincadeira, algo que nunca deixou de fazer em 65 dos 125 anos de FC Porto.
1953 entrou no FC Porto em
Ordenado:
por dia... para ganhar cinco cêntimos