O futebol é mesmo uma grande paixão
A Champions deu-nos dois grandes jogos, que quase fizeram esquecer o ruído dos bastidores do futebol português
O Tottenham soube aproveitar a juventude e uma certa ingenuidade do Ajax em certos momentos do jogo
N uma altura em que, particularmente e infelizmente em Portugal, se coloca muito em causa o que é o futebol e em que proliferam as coisas más que se fazem em nome dele e à volta dele, julgo que os dois jogos da Liga dos Campeões foram uma demonstração séria e inequívoca de que o futebol é o melhor desporto do mundo, pela paixão, pelo fator surpresa, pela espetacularidade. As meias-finais da Champions tiveram tudo isso e, mais ainda, a beleza dos golos e o ambiente extraordinário criado pelos adeptos. Estive como espectador em Liverpool, no jogo com o FC Porto, como já aqui escrevi, e vivi aquele ambiente único que os adeptos criam em apoio à sua equipa. Uma coisa de arrepiar. Nesta meia-final com o Barcelona, ultrapassou tudo – aquele final depois de a equipa dar a volta ao resultado e apurar-se para o jogo decisivo foi algo de emocionante. Primeiro cantando o hino da equipa, o “You’ll never walk alone”, e depois o “Imagine”, um tema eterno de John Lennon, que momento! Percebeu-se facilmente a identificação dos adeptos com a equipa e isso também ajudou a esta reviravolta histórica e épica e que dificilmente sairá da memória de quem a viu e viveu. Muito da vitória inglesa esteve na crença e na vontade que os ajudou a eliminar algumas fragilidades ofensivas criadas pelas ausências de Salah e de Firmino, que tão importantes têm sido ao longo da época, quer internamente quer nos jogos da Champions e em todo o seu percurso. Claro que houve um quarto golo que foi inadmissível, a este nível um erro coletivo da defesa do Barcelona, daquela maneira, não se admite, mas deixou-me a pensar. Acho que tenho de ter mais paciência com os meus jogadores, porque errar é mesmo próprio do homem. Também na outra meia-final houve uma reviravolta, Tinha falado aqui na semana passada que o Ajax poderia ser tramado pela juventude da equipa, que a leva a ser de algum forma ingénua em alguns momentos do jogo. O Tottenham soube aproveitar esse facto e colocar-se pela primeira vez numa final da Champions, fruto também da inspiração de Lucas Moura, que há de um dia contar aos netos que foi um herói improvável numa noite memorável, e que fez esquecer a ausência de Kane, a grande referência do ataque da equipa inglesa.
Falei aqui de dois grandes jogos, que agradaram com certeza a quem os viu, e quase nos fizeram esquecer o grande ruído que anda nos bastidores do futebol português e que é mais forte com a aproximação do final do campeonato. Há acusações, suspeitas, ameaças, fala-se tanto à volta do futebol que quase nos esquecemos do que é mais importante, o futebol jogado. Hoje pode ser um dia crucial para o campeonato em termos de decisão do título. O que eu desejo profundamente é que, independentemente de quem sair a sorrir desta jornada, se fale essencialmente de futebol, ou que haja motivos para falar apenas do futebol e do desporto fascinante que ele é e que os árbitros só sejam motivo de falatório pela positiva. A ver se há alguma paz neste nosso mundo do futebol.