NUNO PINTO “A maior vitória é ficarcurado”
O V. Setúbal assegurou a permanência, mas a bola é dispensada nesta entrevista. A mandar um linfoma para trás das costas, Nuno Pinto exibe a O JOGO o sorriso que o ajudou a ganhar a maior das guerras
Nuno Pinto está a terminar a maratona. Foi-lhe diagnosticado um linfoma em dezembro, ao qual ganhou a batalha. Até 13 de junho, o atleta de 32 anos do V. Setúbal cumprirá os tratamentos no IPO de Lisboa e detalha a O JOGO a superação, que culminou com oito minutos no último jogo da liga. Oito minutos de bola que foram a força para vencer a guerra.
Depois de cinco meses de tratamento, como foram aqueles oito minutos em campo? —Falei com o capitão, o Vasco Fernandes, e disse-lhe que queria duas coisas: a permanência do V. Setúbal e poder jogar no último jogo. Disse isto um mês antes do final do campeonato,depoisdosegundo exame de contraste ter confirmado que já não tinha o linfoma. Os médicos disseram que não jogava mais esta época e meti na cabeça que ia conseguir. Só graças aos meus colegas é que poderia jogar porque tínhamos de ter a permanência assegurada e o Rio Ave não ter a Europa em jogo. Não queria afetar a verdade desportiva. Felizmente, ganhámos ao Chaves e festejámos. Vou confessar: nem vi esse
jogo.
E podia jogar mais? —Pedi aos médicos para parar o tratamento, que decorria à quinta-feira, de 15 em 15 dias. Eles recusaram, mas já treinava há dois meses e meio. Acabaram por autorizar-me a jogar, mas pouco tempo. Até brinquei com o míster Sandro: ‘Se me tirar antes dos 10’, recuso-me a sair [risos]’. Agradeço-lhe. Nem dormi nessa semana. Foi mais difícil informar o plantel ou a família? —O plantel ficou muito abalado. Deilhes força, transmitilhes que ia ultrapassar “Cádiz tem tudo o que se quer num ponta de lança” O lateral do V. Setúbal elogia o plantel sadino. Cádiz, a caminho do Benfica por quase três milhões de euros, merece os aplausos: “É um excelente jogador e um grande profissional. É tecnicamente forte, alto e possante. É rápido também. Tem tudo o que se quer num ponta de lança. Dá garantias.” O atacante venezuelano de 23 anos esteve emprestado ao Vitória pela Sanjoanense e acabou a temporada com dez golos. Um progresso que deve relembrar, segundo Nuno Pinto: “Ainda no outro lhe disse, ‘estiveste nos sub-23 e deste o salto. Futebol é momento.”
Nuno tem três filhos. Beatriz, de 12 anos, entendeu o mediatismo. O bebé Danny dormiu no carrinho durante a entrevista
o linfoma. Porém, foi mais difícil comunicar a quem amamos. Fui preparando a minha mulher [Cátia]. Quando senti o papo na barriga, depois de os valores das análises não estarem bem. Fui para a biópsia preparado. Ela chorou tanto, mas acompanhou-me e foi o meu pilar. A sua filha de 12 anos apercebe-se do mediatismo? —Ela pratica natação e sinalizámos o colégio e os professores. Pedimos paciência. Chorou ao início, mas alegrou-se por saber que estaria mais tempo com ela. Agora, com as notícias, tem outra noção...
Pensou deixar o futebol? —Nunca tive momentos de pânico. Não achei que terminaria a carreira, mas a maior vitória é estar curado, voltando ou não aos relvados. Não tinha sono e passava pelo quarto dos meninos e pensava que ia superar aquilo por eles. De acordo com a DireçãoGeral de Saúde, sete em cada 100 mil pessoas têm esta doença. —Agora se fizermos essas contas nos futebolistas é para aí um num milhão. Claro que pensei ‘porquê eu?’, mas a minha infância não foi fácil. Deu-me a força para esta barreira.
Como quer ser lembrado? —Pelo profissional que sou, não por esta doença. Nem me sinto um herói. Posso ser um exemplo, porque posso levar as pessoas a fazerem análises mais cedo. Isso foi decisivo no meu caso. Posso alertar, mas há tanta gente tão doente.
“Quero ser relembrado pelo profissional que sou. Foi por isso que se solidarizaram comigo. Não me sinto um herói” “Os médicos disseram que não jogaria mais esta época. Meti na cabeça que ia conseguir. Nem vi o jogo da festa em Chaves” “Não quis afetar a verdade desportiva. Só jogava se as contas da liga estivessem resolvidas”