ESTÁ NA HORA Não haverá melhor
A ajuda da Altice aos clubes cujos direitos televisivos adquiriu é um gesto de solidariedade que, seguramente, fará muita diferença neste momento. Mas em nenhum dos casos fará toda a diferença, porque o problema se mantém: o futebol português assenta hoje – quase todo ele – num modelo de negócio obsoleto, que já se previa tornar-se obsoleto há anos, começara a verificar-se realmente obsoleto bem antes da covid19 e, entretanto, nunca mais se reerguerá. Em qualquer contexto o princípio da antecipação de receitas é mau, porque de repente os dados mudam – com uma pandemia, com um acidente de avião, com um penálti falhado – e depois não há dinheiro. Ontem mesmo ficámos a saber que até o Manchester United, líder histórico do processo de empresarialização do jogo, experimenta hoje problemas de tesouraria (também) por via de uma antecipação de receitas que vai ter de devolver e, entretanto, cada vez menos consegue compensar com os resultados desportivos e negociais. Pois é em mais uma versão desse desequilíbrio que FC Porto, V. Guimarães, Boavista e Rio Ave incorrem agora. Felizmente, não são verbas colossais, e o contexto é de facto de emergência. Mas nada disto deixa de ser expressão do mesmo vício que deixou todo o futebol português a sobreviver de uma economia fictícia, especulativa no mais puro sentido da palavra, e que tem como único expediente, a cada sobressalto, tornar a empurrar com a barriga para a frente. A minha surpresa é que, tirando talvez do Sporting – que, de qualquer maneira, não tinha alternativa –, não leio sobre um só projecto (ou ouço uma só ideia) de reestruturação, seja em que clube for. E, se não o lemos nem ouvimos numa altura destas, em que a reinvenção é tanto uma necessidade como um desejo – no futebol e na própria sociedade –, vamos lê-lo e ouvi-lo quando?