DANIEL RAMOS “Acho que ganhei o de safio”
MUDANÇA Saída do Boavista foi algo estranha, faltou uma conversa que estava prometida pelo presidente, mas o caminho agora é outro. Trata-se de um regresso aos Açores, onde é muito querido
Aos 49 anos, Daniel Ramos volta aos Açores, para um novo projeto na I liga. Para trás, deixou o Boavista e um trabalho muito meritório. Subiu a pulso na carreira e quer chegar muito longe
Daniel Ramos, ou melhor dr. Daniel Ramos, porque o novo treinador do Santa Clara é formado em Gestão do Desporto, acaba de fazer um percurso no Boavista que lhe permitiu realizar um campeonato tranquilo. Saiu com a certeza do dever cumprido, mas deixa escapar algumas palavras que refletem estranheza pelo facto de não lhe terem dito que não ia continuar e até por terem começado a falar na sua substituição quando a permanência nem estava garantida. Esperamos que seja um prazer para o leitor ler esta longa conversa que O JOGO teve com o vila-condense.
O Boavista alguma vez jogou segundo aquilo que você idealiza para uma equipa de futebol?
Aconteceuprincipalmentedepois da retoma, em alguns jogos. A equipa revelou um enorme crescimento, transfigurámo-nos para muito melhor. Aproveitámos bem a paragem. Naparteinicial,quandochegámos, não conseguimos fazer o que queríamos, os resultados não ajudaram e perdeu-se a confiança. Na paragem, trabalhámos a parte mental muito bem. Os resultados tiveram de ser a prioridade. —
Para si e para o grupo, a paragem acabou por ser muito boa...
— Foi mau, claro, porque estamos a falar de uma tragédia mundial, mas para o nosso trabalho acabou por ser positivo. Permitiu-nos uma pré-época, um assimilar de ideias, a equipa respondeu muito bem e foi possível mudarmos para muito melhor. Nas dez jornadas que faltavam fizemos bons jogos, com alguma intermitência, mas a maioria deles com qualidade. Não foi na plenitude o futebol com que me identifico, porque ainda havia muito para crescer... A equipa teve uma grande evolução, embora
sem chegar onde queria.
Sim, fizeram grandes jogos, como com o Moreirense, e que até perderam...
—Sim, nesse jogo até dei os parabéns aos jogadores no final, porque foi daqueles jogos em que vamos para casa e chegamos à conclusão que fizemos tudo bem.
E conseguiu limpar aquela imagem que o Boavista tem para algumas pessoas, de ser uma equipa de caceteiros...
—O Boavista não pode nunca
perder o facto de ser uma equipa de raça, há muitas pessoas que conectam o Boavista com algo diferente disso. Isso é que não é bom. O Boavista não pode perder o seu ADN, mas pode aliar a isso uma qualidade de jogo que pode ser melhorada. Aliás, esse foi o caminho que imaginei quando fui para o Boavista, manter o ADN e montar uma equipa organizada e com qualidade. Ter um jogo ofensivo atraente. Sabia que era um desafio difícil, porque ia romper com muito do que estava interiorizado pelo grupo. Havia uma grande diferença entre a ideia de jogo que eu tinha e a que existia. Acho que ganhei o desafio.
Pensa que os adeptos ficaram contentes consigo
e com o seu trabalho?
—Nem sempre os resultados ajudaram e os adeptos, em todos os clubes, olham muito para os resultados, é por aí que classificam um bom ou um mau treinador, um bom ou mau jogador. Mas acho que eles perceberam que com poucos ovos conseguimos fazer boas omeletes e de qualidade. Acho que olharam para isso. E nunca me ouviram a queixar; foi aquilo que me foi dado, foi aquilo que o Boavista podia dar. Julgo que os adeptos perceberam isso. Passámos por adversidades, as pessoas do piso 1, que era o que ocupávamos, estão bem no alto. Não havia nenhum eu, era sempre nós. A estrutura deu-nos todo o apoio possível.
“Foi estranho o que aconteceu. Um dia vou falar com o presidente para tentar perceber o que se passou” “Procurei manter o ADN do Boavista e montar uma equipa organizada” “A equipa, depois da retoma, teve uma grande evolução, embora sem chegar onde eu queria” “Os adeptos do Boavista perceberam que com poucos ovos conseguimos fazer boas omeletes e de boa qualidade” “Não sei de onde saíram as notícias do novo treinador. Para mim foi um grande mistério”