João Mário e o erro de cuspir para o ar
Abunda a esperteza saloia na transferência do médio para o Benfica. Todos sabem o que acordaram e, apesar disso, ninguém hesita em usar o expediente mais indigno para lhe fugir
A transferência de João Mário para o Benfica há de ser um caso de estudo na FIFA: todos os intervenientes, com a eventual exceção do jogador, estiveram mal e sempre de uma maneira descarada. Começa pela cláusula antirrivais que, sendo prática comum, é uma violação da liberdade de escolha. Vender um futebolista, lucrar com ele, e, ainda assim, poder controlar-lhe o futuro indefinidamente (sem que ele ganhe mais por isso) não tem justificação. Depois, vem a artimanha da rescisão de contrato, pelo Inter, para disponibilizar João Mário, a custo zero, ao Benfica. Havendo a alternativa de o transferir para o Sporting por três milhões de euros, mais dois por objetivos, os milaneses devem ser o clube mais altruísta do planeta, uma espécie de São Francisco de Assis do futebol. Segue-se o comunicado do Inter, depois da indignação sportinguista: “As declarações são inaceitáveis, extremamente graves e, mais importante, infundadas.” Não são. Só se for obrigatório fingirmos que somos patetas. Inaceitável é um comunicado que faz dos leitores estúpidos, sendo certo que não podia constar do texto uma verdade que o Sporting tem de ouvir.
Perde-se um pouco de moral para falar em “expedientes” quando se usou a rescisão de contrato, pós-Alcochete, para recusar à Sampdória o pagamento de 10% da mais-valia da venda de Bruno Fernandes ao Manchester United. Pode ser eventualmente legal, de uma forma muito torcida, mas não respeita os “valores” de que Varandas está sempre a falar, tirando a hipótese de esses valores serem como os de Groucho Marx: “Estes são os meus princípios. Se não gostarem, tenho outros.” Tudo somado, mais um episódio infeliz e até pouco inteligente. Nos negócios do futebol, nunca é boa ideia cuspir para o ar.