O Jogo

A centraliza­ção dos direitos TV, VAR II para os amigos

- José Manuel Ribeiro

Bem-vindos ao VAR II. Em 2028, ou mesmo antes (se calhar, já daqui a um ano!), as desigualda­des vão arrepender-se de terem nascido, porque estará aí a centraliza­ção dos direitos televisivo­s para lhes tratar da saúde. Os operadores NOS e Altice farão o favor de não se entenderem, por baixo da mesa, para manterem os preços das transmissõ­es baixos, e no imenso estrangeir­o inexplorad­o todos ficarão encantados com as maravilhas da Liga Bwin, sobretudo os pratos principais, como o Sporting-FC Porto de ontem.

Todos os esforços foram feitos para que fosse o melhor espetáculo possível, incluindo garantir que um dos jogadores mais atrativos para os novos clientes (Luis Díaz) pudesse tomar um pequenoalm­oço completo com os colegas (e talvez combinar algumas jogadas), depois de chegar da seleção à noite, na véspera do jogo. Dirão que a Liga não tem culpa disso. Exato: os campeonato­s internos são tratados a pontapé, por FIFA e a UEFA, e há sinais de que piorará. A Liga não pode prometer que não voltarão a ser marcados jogos de seleções para uma quinta-feira. Não tem autonomia para garantir qualidade.

E os portuguese­s, tão confiantes na centraliza­ção como estavam no VAR, acham mal que se proteja os “grandes” no calendário. A diferença entre os adeptos de Sporting, FC Porto ou Benfica e os do V. Guimarães ou do Belenenses, é que os segundos detestam três grandes e os primeiros detestam dois. Problema: não há outro caminho para a igualdade na Liga nacional que não seja a desigualda­de. Lá fora, no tal estrangeir­o, só comprarão (eventualme­nte) aquilo que conhecem, os poucos clubes e jogadores que já viram na Liga dos Campeões ou nas seleções, talvez na Liga Europa. Até que se arranje maneira de crescer, não há mais nada que este campeonato possa ter esperança de vender. Os “grandes” demoraram a perceber que três equipas não fazem uma liga (se é que perceberam, calma), mas e as outras quinze aprenderam o quê em todo este tempo?

Enquanto discutiam com caras sérias e grande indignação a centraliza­ção dos direitos e o imperativo de internacio­nalizar a “marca”, algumas batiam recordes de ridículo com o antijogo, enquanto outras se riam das tentativas da Liga para as obrigar a cuidar dos relvados em vez de os lavrarem. Será fácil vender um campeonato que está, constantem­ente, entre os piores da Europa no tempo útil de jogo? E estamos ainda dentro do campo. Se sairmos, e lermos os jornais, compreende­mos que nem sequer os “três grandes” são, afinal, uma arma para ir ao mercado. São eles próprios que se tratam como bandidos, incompeten­tes, corruptos e indesejáve­is, e nem me refiro a acusações concretas, inescapáve­is, mas ao discurso corrente, porque é imprescind­ível fazer rir o adepto ou insuflar os genitais para a audiência. Enquanto se fazem profundos estudos sobre a exportação da Liga, os agentes descredibi­lizam-se mutuamente todos os dias, em geral por mera graçola, sem nenhum propósito útil. Carlos Pereira, presidente do Marítimo, não conseguiu admitir a evidente miséria do relvado nos Barreiros e atacou, claro, as regras e a Liga.

Os “três grandes” concentram a maioria dos casos de mau comportame­nto dos adeptos (também será um bom “produto”?), mas recusam-se a aceitar uma única condenação e combatem, mais do que apoiam, as medidas que vão sendo tomadas. O chinfrim exagerado à volta do cartão do adepto é um exemplo, e nem falemos dos regulament­os mais básicos. Uma Liga que discute cartões amarelos em tribunal talvez não seja bem um artigo de luxo. Não finjamos, por isso, que a centraliza­ção eliminará o erro humano, porque eles são demasiados. É uma ferramenta fundamenta­l, mas só uma ferramenta. Do outro lado, continua a avaria.

 ??  ??
 ??  ?? Teorias do Caos
Teorias do Caos

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Portugal