O Jogo

O futuro em 4 dias

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Os avançados partilham actos de solidão com os guarda-redes em muitos momentos do jogo. Deles, esperam-se actos decisivos, antagonist­as e adversário­s nos desejos, específico­s que são na sua função, especialis­tas. Jogam e estão nos antípodas do que 90 minutos podem oferecer. Marcar golos ou evitar golos, basicament­e a síntese de finalidade­s últimas de um jogo de futebol desde que a bola sai do centro até ao apito final. O grande elemento diferencia­dor de afectos está na cobrança. Ninguém cobra um falhanço a um avançado da mesma forma que cobra um “frango” a um guardarede­s. Talvez porque aos avançados, esperamos sempre que acabem por marcar, mais cedo ou mais tarde. E, sobretudo, porque um golo sofrido é realidade, mas o golo que ficou por marcar é só futurologi­a. Na Liga dos Campeões, Mehdi Taremi desperdiço­u ocasiões de golo para avolumar o resultado do FC Porto - AC Milan para patamares históricos. Ficou a ideia de que a exibição daquela noite ficou a dever golos à justiça final. Eis senão que, no regresso à realidade nacional frente ao Tondela, o avançado iraniano veste literalmen­te a pele de carrasco, fazendo um “hat-trick” pleno de oportunism­o. Três golos em três oportunida­des, inventando golos nos centímetro­s onde outros avançados reclamam metros para decidir. E assim, em 4 dias, transforma o perdulário em matador. O que confirma a tese de que tudo se perdoa a um avançado se ele souber tratar do futuro. Se um guarda-redes lida com o passado, mesmo aquele que acaba de acontecer, um avançado pode ter o privilégio de nos fazer augurar o que aí vem.

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