Ninguém sente falta do que não existe
1 Uma das formas mais astutas de contornar um problema tático (resultante da falta dum jogador para uma posição-chave) passa por mudar o sistema de jogo (e, assim, tirar tanta importância a essa posição ou fazê-la desaparecer). Vitinha saiu do FC Porto e deixou um vazio de estilo associativo entre saída de bola, organização e passe, que fazem dele, hoje, um médio nº 8 completo. Sem ele, o sistema e dinâmica de jogo preferencial portista perdeu o seu catalisador tático. A primeira solução de Conceição foi, sem ter alguém capaz de reproduzir as suas ações, a criação dum novo sistema para distribuir o onze. Assim, ao mesmo tempo que, individualmente, reinventava Pepê de ala para zonas mais interiores e lançava, com exigentes missões táticas, Namaso, um avançado da formação, redesenhou coletivamente o onze para um esboço de 4x4x2 losango que na distribuição dos jogadores não tem, de raiz, a tal posição nº 8 subitamente órfã. 2 Entre uma opção de recurso e (mais) uma nova ideia de jogo para a equipa, o FC
Porto entra a época a jogar de forma diferente. Mantêm a alternância entre o futebol mais de busca rápida da profundidade com o ataque organizado posicional (mescla de variantes que, no fundo, unem duas etapas-tipo de Conceição em cinco épocas de Porto) mas cria uma estrutura nova onde o tal miúdo Namaso, nº 9 de vocação, aparece tantas vezes no chamado “espaço 10” (a tal missão exigente), ficando na frente, em movimentação de trocas posicionais coletivas complementares, a dupla Evanilson (referência mais fixa de nº 9) e Taremi (mais móvel em largura a descair na esquerda, donde saem diagonais do vértice lateral desse lado em que se tornou Pepê, cada vez mais a jogar por dentro). Desta forma, com a âncora Uribe a nº 6, Grujic avançando pressão na meia-direita e a subida dos laterais ofensivos João Mário-Zaidu, ficava desenhada a nova estrutura, entenda-se ponto de partida para a equipa (jogadores) se começar a mover e jogar. Neste opção tática, o nº 8 de perfil-Vitinha não existe. E, naturalmente, ninguém sente falta de algo que não tem existência natural na nossa vida (neste caso, na vida tática duma equipa de futebol).
3
Repare-se, porém, que, nada disto retira a importância e a necessidade de ter um jogador com as características perdidas de Vitinha (ou de um nº 8 com outros traços mas igual disponibilidade intensa queima-linhas central como foram Herrera ou Sérgio Oliveira). Foi tendo um médio desse perfil que jogou melhor. Para voltar a ter (sem reforços) uma espécie desse calibre tático só reinventando outro jogador. Será esse o caminho de Otávio (rumo ao habitat central) ou a solução está mesmo em resolver o problema posicional fazendo-o, pura e simplesmente, desaparecer taticamente do sistema?
Resolver a lacuna numa posição fazendo-a desaparecer