E depois do adeus
Asaída aparentemente precoce de Portugal, abrindo caminho à primeira presença de uma selecção africana nas meias-finais de um Mundial, acontece produto de mais um jogo anónimo, temeroso, sem que se identificassem causas reais para tanto taticismo e, sobretudo, para a manutenção de tanto receio ou conservadorismo na abordagem ao jogo quando, claramente, o plano inicial não estava a dar frutos. Para além do que todos vimos na primeira parte, os dados objetivos não deixam mentir: entrando com o propósito de ter tal segurança na posse de bola que não permitisse o contra-ataque a Marrocos, Portugal termina os primeiros 45 minutos a perder e desesperado pela própria lentidão e inconsequência, com menos remates, menos remates enquadrados, menos cantos, apenas uma oportunidade de golo (como o adversário). Um falhanço redondo na abordagem ao jogo que, em sequência de agravo, nunca se tentou corrigir. Quando tanto se fala e escreve sobre a presença de Ronaldo no banco, estranho é que não se fale sobre a sua ausência em campo. Com um Ronaldo em forma, sem casos provocados ou autoflagelados, a jogar normalmente no seu clube desde o início da época, estaríamos muito próximos de ser campeões do mundo. Assim, sem Ronaldo, as hipóteses eram mínimas. Faltou quase sempre a coragem que ele esbanjou, deu e vendeu nas quatro linhas. Este extraordinário grupo de jogadores, geração indefetível de talento, ficou à espera, refém de liderança em convulsão. Viveu na sombra de um líder, não querendo abusar da ingratidão, mas sem querer deixar de ser livre. Não encontrou alternativa quando esta foi para o banco. Encontrou-se numa ilusão frente à Suíça, onde mostrou do que é capaz quando se solta com espaço e criatividade. Definhou, presa ao taticismo e sem o abre-latas que tantas vezes Ronaldo foi, acabrunhando-se numa primeira parte sem coragem, equivocada e ausente. Há uma seleção AR e uma selecção DR. Apesar de Ronaldo ainda ir a jogo, sente-se o tempo da despedida. Esta é já uma seleção “depois de Ronaldo”. É ele o último a entrar e o primeiro a sair. Entre tristeza e incompreensão,entreamuoechoro convulsivo,étempode reconhecermosoHomemque fezagrandiosidadedoatleta,é tempodeadmitirmosqueasua generosidadecoletivaencontra fundamentonoseuprofundo individualismoesóassimfoi possível assistirmos, em vida, ao maior atleta português de todos os tempos. Neste sentido, este Mundial é já depois do adeus. E como vamos sentir a sua falta.