O futuro não se constrói com um pé amarrado no passado
Marrocos era um adversário ingrato para Portugal defrontar nos quartos de final de um Mundial. Pela forma especulativa como joga, claro, mas também e sobretudo pelo estatuto que tem no futebol internacional e que colocava a Seleção Nacional naquele lugar desconfortável que fica mais ou menos entre a espada e a parede: afinal, ganhar ao 22.º classificado do ranking da FIFA nunca seria muito mais do que cumprir uma obrigação enquanto perder seria sempre um escândalo. Não foi preciso esperar muito tempo após o apito final do argentino – só a FIFA é que se lembra de pôr num jogo destes um árbitro de uma seleção que ainda está em prova – para começarem a ouvir-se as primeiras vozes a reclamar cabeças. Fernando Santos, que até tinha posto a dele no cepo quando sentou Ronaldo no banco, já veio dizer que vai falar com Fernando Gomes quando chegar a Lisboa para avaliar o que é melhor para o futuro da Seleção, embora sublinhe que a palavra “demissão” não faz parte do vocabulário dele, nem do léxico do presidente da FPF. Ainda assim, o final prematuro de um Mundial que fez Portugal sonhar com um lugar na história é, inevitavelmente, um momento para fazer balanços. O desta presença no Catar ficará certamente marcado pela decisão de subtrair Ronaldo ao onze titular. Acusado de ser avesso ao risco, Fernando Santos correu todos ao sentar o capitão no jogo com a Suíça e Portugal respondeu com a melhor exibição coletiva dos últimos anos. A derrota e a consequente eliminação frente a Marrocos impediu a sequência de que a equipa precisava para crescer nesse modelo de jogo mais solidário servido pela qualidade de uma geração excecional, mas não deve apagar a convicção de que aquele é o caminho para o futuro imediato da Seleção. Ronaldo terá, certamente, um papel a desempenhar nessa equipa, mas Fernando Santos deu o passo mais difícil para qualquer selecionador português ao tirá-lo do onze e ao demonstrar, para lá de qualquer dúvida razoável, que há vida para além dele. Se isso chega para manter o cargo de selecionador, considerando o desgaste a que foi sujeito nos anos que se seguiram à conquista do Europeu de 2016 e da primeira edição da Liga das Nações? Pois essa é uma pergunta a que só Fernando Gomes será capaz de responder. Mas seja com Fernando Santos, seja com outro treinador qualquer, aquilo que o Mundial do Catar deixou claro é que o futuro de Portugal não se pode construir com um pé amarrado ao passado, por muito importante e glorioso que esse passado seja. Provavelmente, esta geração de jogadores só existe com a qualidade que todos lhe reconhecemos porque alguém da dimensão de Ronaldo lhe abriu as portas. Por outro lado, só pode explorar todo o potencial que encerra se for autorizada a trilhar o seu próprio caminho e a brilhar com a sua própria luz. Portugal não venceu este Mundial, mas deu um enorme passo em frente rumo ao futuro. Seja quem for o selecionador depois de amanhã, o importante é não andar às arrecuas.
A derrota contra Marrocos não deve apagar a convicção de que o futuro da Seleção passa pelo modelo de jogo que se viu contra a Suíça