A mobilidade e concentração da visão de jogo
1 Ganhou uma perceção de jogo ao ponto de, apenas através de um movimento, fazer combinar toda a equipa no processo atacante, que tentava aparecer por dentro. Gonçalo Guedes (que antes era quase sempre um mero avançado de faixa) aparece, agora, a toda a dimensão do ataque. Um impacto que torna redutora a questão se irá jogar no meio (segundo avançado) ou na faixa (extremo) no sistema de Schmidt, tal a atual influência da sua “visão de mobilidade de jogo” em todo o ataque, muito diferente do jogador que saiu do Benfica há alguma épocas.
Em Arouca, com o onze sem um ponta-de-lança de raiz, surgiu mesmo a partir do “espaço 9” e fez dançar com essa mobilidade a cerrada e populosa defesa adversária. Permitiu, assim, a criação da mais improvável dupla atacante em 4x4x2 com David Neres (ala genético) jogar no corredor central nas suas costas (ou melhor, em seu torno, aproveitando os espaços que os movimentos de Guedes abriam). Um impacto tremendo e imediato que deu uma superior cultura de movimentos integrados ao ataque benfiquista que antes coletivamente não tinha. *
2 A jornada dos grandes jogou-se em dois dias estilhaçados pelos choques do mercado. Ao mesmo tempo, porém, da faraónica partida de Enzo, o Benfica corria, com um frio “quebra-ossos”, por todo o meio-campo, com um jogador impassível a tudo (como a frieza nórdica sempre faz parecer) a ligar pontas atrás e à frente, no meio ou na ala. É o futebol permanentemente focado de Aursnes. Nunca se perde em cenários supérfluos, de bolas que vão fugir, queixas de faltas, conflitos com adversários, lamentos que sejam. Está sempre, imperturbável, em busca da melhor solução tática para a sua equipa, numa rotação alta em todos os momentos do jogo (defender, atacar e respetivas transições). Acho que pode ser o novo dono do corredor central do meio-campo encarnado com amplitude de influência a toda a largura do terreno. Concentração em qualidade.
3 Falhou com estrondo a estratégia de Artur Jorge com três centrais e laterais tornados defesas para, em largura, esperar de frente os alas do Sporting. A equipa estranhou essa mudança tática para um 3x4x3 que, no fundo, tinha na base o princípio defensivo de criar “linha de 5”. Jogando à partida em função de anular o adversário nunca conseguiu depois soltar-se para o seu momento ofensivo no jogo. Viveu desposicionada num “jogo de pares” que mutilou a sua identidade. Imaginei que mudasse ao intervalo e resgatasse a “linha de 4” e a autodeterminação no jogo. Não o fez, sofreu o 2-0 mais a expulsão e acabou desintegrada em campo. O Sporting sentiu-se, assim, crescido desde o início perante o receio que lhe estavam a mostrar. Ganhou confiança e goleou como se estivesse olhando ao espelho (tal o reflexo do seu sistema em marcações que o Braga quis, sem sucesso, criar).