O “jogo soneca” competente
1Definiu-o como o “jogo competente”. No guião do modelo tão previsível como incontrolável (de que outras equipas se lembram que apliquem estes dois adjetivos aparentemente tão contraditórios para a definir?), o Sporting construiu um jogo calmo pelo que fez logo no início. A rota do jogo voltou a ser a mesma, metendo o ritmo da pressão alta usando o físico em antecipação de Hjulmand e o poder (após escapar à marcação em cima) de Gyokeres. Ganhando a maioria dos duelos em campo, ganhou o jogo antes deste verdadeiramente começar. Isto é, antes de a máquina de contenção e saída rápida de Moreira assentar taticamente em campo. Quando o começou a fazer, já perdia 0-2. Era demais contra o tal jogo leonino que manteve-se competente o resto do tempo. Essa obediência ao modelo deixa sempre margem à liberdade para criar na frente (o território vagabundo de Pote e Trincão).
2
Vejo-o como o melhor “reforço” do Benfica para a parte final da temporada. O regresso de David Neres contagia pela insolência com que pega na bola e, com ela, mete no jogo coisas diferentes de todos, demonstrando facilidade técnica um-para-um, para no momento certo definir. Uma criatividade distinta da acelerada de Rafa ou da burguesa (deixando a reação à perda para outros) de Di María.
Noutra expressão, Neres tem a pausa e a finta que dão vida ao
controlo e passe. A mudança de velocidade que quase se confunde com uma simulação (lá está a pausafinta em versão objetiva) ilude qualquer defesa sobre o que vai fazer a seguir. Um “falso soneca” que acorda sempre o jogo (e a equipa para outras formas de vida) quando tem a bola.
Schmidt mexe na equipa de forma insondável. Mete jogadores nos tempos de descontos quer esteja a golear ou a precisar de marcar. Raramente joga mesmo a partir do banco. Neres pode ser a forma mais simples e óbvia de o passar a fazer. Bem antes do tempo de descontos, claro.
3
Não sei se o jogo era mesmo decisivo para Artur Jorge. Se era, tal não fazia sentido,
porque um treinador tem de ser sempre avaliado pelo que faz na execução dum plano global do que por uma fase em que a equipa não está a ganhar (sobretudo numa altura em que os melhores avançados desapareceram, lesionaram-se ou deprimiram). Todos? Não! Existia um que, regressado da paisagem africana, voltou com a mesma descontração para andar pelo meio da área cheia de defesas adversários: Banza.
Com a bola a vir no ar, limitou-se a segui-la e cabeceá-la subtilmente quando chegou perto dele como se não existisse mais nada em seu redor. Tão simples como a forma serena como a bola entrou num momento em que a equipa vivia (jogava) tão nervosa.
O jogo competente tanto é gerir uma vantagem como saber construí-la: Neres, Banza e a previsibilidade incontrolável do Sporting