O Jogo

De boas intenções está o inferno verde cheio

- Luís Freitas Lobo luisflobo@planetadof­utebol.com

1 Um jogo com horizonte para os 90 minutos seguintes (outro jogo) nunca será igual no plano mental e de risco estratégic­o. Um convite à gestão (com mais ou menos contenção) para as equipas (sobretudo a que joga fora) olharem o jogo como um objeto de estudo tático.

Neste dérbi, esse papel de gestor estaria em princípio mais para o Benfica de Schmidt, onde o plano coletivo tem sido quase sempre dependente dos impulsos individuai­s. A entrada no jogo aparentava a intenção de pressão alta e bloco subido.

Todos os minutos até final da primeira parte mostraram que dessas boas intenções estava o inferno verde cheio de comer com a sua maior capacidade de recuperaçã­o de bola, saída rápida e mobilidade ofensiva (em técnica ou força).

O enigma de ver um ataque com Rafa, Neres e Di María, e, mesmo assim, não se ver um lance de perigo resolvia -se vendo a incapacida­de da dupla de médios centro ganhar a bola (João Mário não é 6 nem 8 de lances divididos) ou sair a jogar (Neves, sem bola, estava preso a missão de cobertura) para ligar com o 10 de último passe (Kokçu, em potência com tudo para isso, mas na prática, sem bola, sem o essencial para o ser).

2 Quando um defesa não pode desarmar um pontade-lança deve conseguir… desencamin­há-lo (isto é, temporizan­do a fechar espaço de explosão).

Otamrndi fez o contrário perante o arranque de Gyokeres, que se aproximava dele em versão locomotiva. Quis ganhar no choque, ficou para trás como se o “viking” passasse como um fantasma por uma porta. Imparavelm­ente simples. Hjulmand é um “comedor de bolas” que com Morita ao lado, junta no setor os traços de recuperaçã­o, transição e passe (seja este o último ou o primeiro).

Mais do que a superiorid­ade numérica que o 4x3x3 de três médios podia dar ao meio-campo, impunha-se a dupla de um 3x4x2x1 pela maior e melhor ocupação de espaços, com e sem bola) do coletivo tático e “pequena sociedade” de dois médios centro com conexão telepática naqueles diferentes momentos do jogo.

O problema é quando o jogo passa a “fatura física” a esta dupla, mostrando-lhe o desgaste no seu decorrer, faltam soluções de peças para substituir (e manter) a rotação dessas máquinas no sistema leonino. A segunda parte foi, assim, tornando-se cada vez fisicament­e mais longa para o coração tático acelerado dos médios verdes. E perdeu, assim, o controlo do jogo.

3 O cresciment­o do Benfica voltou a ter muito de individual. E nesse campo de “jogo particular”, outra vez Di María e os coelhos a saírem da sua cartola.

O cruzamento metendo a bola com olhos abertos para o golo e a jogada seguinte que começou e acabou (mas que apanhou pelo meio Tengstedt a passar na sua frente e foi por isso anulada). A forma de ter Di María, um jogador que não defende, é meter outro avançado (ponta-de-lança) perto dele que faça esse trabalho (mesmo que lute mais do que jogue) e o liberte para ser o diferencia­ndor a inventar com a bola. Foi o impacto colateral da entrada de Tengstedt para 9, mudando as coordenada­s da marcações leoninas, e dando também outra amplitude de movimento dentro-fora/centro-faixa de Kokçu, tornado 10 vagabundo e Rafa segundo avançado de ruturas desde trás.

Dois foras-de-jogo confidenci­ais de VAR tiraram dois grandes golos do jogo. Um para cada lado, quando Di María e Nuno Santos já os festejavam além-tá ticas. O futebol moderno não tem, porém, sentimento­s. Os golos bonitos deixaram de poder receber flores.

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Neres e Pote num dos muitos duelos do dérbi de ontem

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