O Jogo

CRUEZA “Não houve dúvida do que fazer ali”

Parrado refuta qualquer debate interno no meio dos Andes; lamenta que muitos falem sem se posicionar­em no contexto

- PEDRO CADIMA

Fernando Parrado aborda tema que suscitou sempre mais falatório público, pela história de sobrevivên­cia ter implicado comer carne humana, durante 72 dias, sem visão de escape e a 25 graus negativos.

Sabendo-se que o instinto de sobrevivên­cia levou a que comessem carne humana durante o calvário de 72 dias, mergulhado­s num cenário dantesco, Fernando Parrado não aceita mil e uma dissertaçõ­es sobre o passo dado por cada passageiro e pela visão da morte que o atormentav­a. Todos,sem exceção,s ocorreram se dos adereços possíveis para fazerem camas e se acautelare­m do gelo, mas também dos corpos de quem tinha morrido e ficado nos destroços na cordilheir­a para se manterem alimentado­s, ligados a uma ténue esperança. Um debate público reprovado por Parrado, corrigindo qualquer prática de canibalism­o pela antropofag­ia. “Todas essas perguntas resultam de quem vê tudo isto de fora. No meu caso particular e falando por todos os que sobreviver­am, nunca houve dúvidas do que fazer ali! Pode ser uma discussão interessan­te em qualquer sala, mas eu sei, tenho a certeza, que qualquer um que ler esta entrevista, se estivesse naquele lugar, naquele exato momento, abandonado à morte mais lenta, fria e horrível que se possa imaginar, teria feito exatamente o mesmo que nós fizemos. Ninguém se pode outorgar de expert neste tema, apenas o somos nós, fomos consultado­s por médicos, psicólogos e universida­des variadas. Ninguém pôde discutir o que fizemos. Talvez o tenham feito algumas pessoas em conversas privadas entre elas, mas essas nunca imaginaram o que era sobreviver ali. Nunca liguei a esses comentário­s ”, vincou Fernando, afastando qualquer convívio mais agu diz ante com o que ficou para trás, um capítulo que ninguém poderia supor vivenciar. “Cada um teve a sua própria história. Eu sempre fui pragmático, posso dizer que nunca fui abalado por tantas recordaçõe­s e tormentos e coisas mais negativas. Agradeço, mais do que tudo, a possibilid­ade de estar vivo e quando saí desse inferno apenas pensei em não destruir a segunda parte de uma única vida. O que aconteceu é imodificáv­el”, atestou, puxando pela fita que rodou... seguidamen­te. “As imagens nunca me atormentar­am desde que saídos Andes, dormis em sonhosnem pesadelos. Trabalhei muito numa empresa familiar e noutras que criei. As conferênci­as nunca foram parte importante. O desporto, sim, sempre foi imprescind­ível. Dediquei-me dez anos ao râguebi, dois deles depois do acidente, e seguiu-se a paixão pelo desporto motorizado, correndo em motos e carros. Também fizracquet­balle ténis. A normalidad­e encontrei-a muito antes do esperado, pois oito meses após o resgate, jogava râguebi na primeira divisão.”

“Agradeço estar vivo e quando saí desse inferno apenas pensei em não destruir a segunda parte de uma única vida. Oresto é imodificáv­el”

Fernando Parrado

Sobreviven­te

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