O Jogo

O grande Dragão

- Fernando Ribeiro – Vocalista dos Moonspell

No meu último romance (Café Kanimambo) uma das personagen­s é Vítor Batista, a antiga glória do SLB, que acabou os seus dias em desgraça, como coveiro do cemitério de Setúbal. Em puto, via-o meter golos com uma bola vazia, lá “do meio da rua”, numa janela de um café de pau da Lagoa de Albufeira (onde ele vivia numa barraca de madeira ao pé da praia), a troco de uns “shots” de bagaço quando acertava na “baliza”. Imortalize­i essa cena no primeiro capítulo do livro, porque nunca percebi o porquê daquela estrela dos anos 70 estar ali naquele estado, o porquê do Benfica não o ter ajudado naquela situação de miséria.

Ora já Artur de Sousa, “Pinga”, que foi a primeira glória do FCP, acabando a sua carreira de jogador em 1946, teve sorte diferente e graças ao clube da Invicta pôde não só continuar a sua carreira como treinador até 1963, como era o Porto que lhe punha mesa e casa até ao dia da sua morte no mesmo ano. Está imortaliza­do no Museu e qualquer portista que se preze sabe a sua história. Recordo esta história porque o mais importante Presidente de sempre de um clube de futebol em Portugal, o único que figurará na galeria de honra dos Presidente­s dos clubes europeus e mundiais,

A grande vitória de Pinto da Costa, aquela que nunca lhe tirarão nas urnas, será sempre a sua absoluta humanidade

perdeu agora uma eleição a favor do novo sangue que os adeptos do FCP, insatisfei­tos com o rumo recente do clube, elegeram, ou como forma de protesto (está na moda o voto de protesto), ou, quem sabe (e bem o espero como Portista), uma necessidad­e de outros processos para ganhar títulos.

Mas a grande vitória de Pinto da Costa, aquela que nunca lhe tirarão nas urnas, será sempre a sua absoluta humanidade. Que se verifica na forma como tratou antigas glórias e novas estrelas, como redirecion­ou até ao seu ponto mais alto a carreira de diversos jogadores e treinadore­s (Futre, Deco, Mourinho), como conseguiu, contra tudo e todos, durante 42 anos proporcion­ar uma estabilida­de exemplar a um clube que nunca pararão de tentar desacredit­ar. Conheci Pinto da Costa por diversas ocasiões. Numa delas, dei-lhe os meus livros de poesia, e ele nunca mais os largou da mão durante todo aquele evento. Disse-me assim: “Você é do Rock!”, olhando para o meu (outrora) cabelo comprido, blusão de cabedal e brincos. E, desde daí, fui sendo parte da família, nas galas, nos jogos, no museu, no meu entendimen­to antipolémi­co de fruir o desporto futebol, onde, “trés simple”, se perde, ganha ou empata. E assim é, porque ao ser adepto do FCP, sinto que tenho a responsabi­lidade de replicar a generosida­de e a empatia que Pinto da Costa, que será eternament­e o Presidente que nos realizou os mais improvávei­s sonhos desportivo­s, sempre nos demonstrou no futebol, e que só por teimosia e despeito não lhe é amplamente reconhecid­a como a sua mais bonita qualidade, o seu mais precioso troféu.

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