Record (Portugal)

Mestre Manuel Oliveira

DURO COM OS JOGADORES, NÃO CULTIVAVA PROXIMIDAD­ES NEM AFETOS. TUDO SE RESUMIA A TÁTICA, TÁTICA, TÁTICA E À CAPACIDADE DE CONDICIONA­R OS PONTOS FORTES DO ADVERSÁRIO

- Octávio Ribeiro Diretor do ‘Correio da Manhã’

Caro Leitor, permita-me hoje um texto na primeira pessoa: morreu o meu treinador. Manuel Oliveira ensinou-me quase tudo o que sei sobre futebol (não posso também esquecer a gratidão que devo aos místers Bandeira, Rogério Dias e Carlos Cardoso, mas todos eles foram também marcados pelo Mestre).

Tinha 15 anos quando Manuel

Oliveira me disse ‘ miúdo, prepara-te que vais começar a treinar comigo’. Quando os treinos eram de conjunto, lá estava eu a beber as palavras do Mestre, as correções que fazia constantem­ente no posicionam­ento das peças. Sim, peças.

Cada jogador era umapeça,

que o Mestre encaixava na estratégia montada para cada jogo. Não tive a honra de ser lançado por ele em jogos oficiais. Nesse particular, fui aposta de Carlos Cardoso, duas épocas mais tarde, mas treinar com Manuel Oliveira é inesquecív­el.

Foi já como jornalista que en

trei no seu escritório. Na profundida­de do seu pensamento. Éramos vizinhos, no Barreiro. Acolheu-me no seu escritório, uma divisão repleta de livros e cadernos, na sua casa. Aí, perdia a noção do tempo, ao sabor do saber deste metódico Mestre. Aí, me mostrava as táticas que tinha usado em batalhas que considerav­a históricas. Aí, me garantiu, com provas, que fora Fernando Vaz e não outro, o primeiro técnico a montar equipas em 5x3x2. As provas eram folhas de vários cadernos onde o Mestre apontava as táticas que tinha usado, e as dos seus adversário­s, em cada jogo. O também enorme Fernando Vaz montara essa tática no Leixões, quando despontava­m os célebres Bebés de Matosinhos.

O Mestre era duro com os joga

dores, não cultivava proximidad­es nem a fetos. O trabalho psicológic­o não era o seu ponto for- te. Era tática, tática, tática. Aforma como as peças evoluíam para o ataque e, principalm­ente, se fechavam na defesa. Os detalhes com que procurava condiciona­r os pontos fortes do adversário. A sua verdadeira paixão.

Nessa distante época de

1976/77, levou o Barreirens­e à sua última subida ao primeiro escalão. Na luta pelo título da 2.ª Divisão, Manuel Oliveira tinha uma equipa bem mais fraca do que a do Famalicão (de Jaques e Reinaldo) e do BeiraMar (do enorme Sousa). A nossa equipa tinha muita veterania, sendo os jogadores mais categoriza­dos, os já falecidos Câmpora e Pavão.

No final de uma época inten

síssima, com o principal objetivo, a subida, já atingido, Manuel Oliveira multiplica­va os treinos de conjunto, preparava cada jogo ao detalhe, marcações individuai­s incríveis, e só perdeu o título para o Famalicão, muito acima das nossas capacidade­s desportiva­s e financeira­s.

Eraassimo Mestre, queria sempre ganhar, mesmo se o ganhar possível fosse um empate a zero. Manuel Oliveira tinha uma especial admiração pelos grandes treinadore­s italianos, a que somava alguns argentinos. Mestres da tática, como ele. O seu espólio bibliográf­ico é valioso.

A Associação de Treinadore­s,

ou a Câmara do Barreiro, alguém deve pegar naquelas memórias e pô-las ao serviço do futebol, que Manuel Oliveira tanto amou.

ÉRAMOS VIZINHOS NO BARREIRO. NO SEU ESCRITÓRIO PERDIA A NOÇÃO DO TEMPO

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