Record (Portugal)

A galinha dos ovos de ouro

BENFICA E PORTO FORAM OS DOIS CLUBES QUE MAIS DINHEIRO FIZERAM NA ÚLTIMA DÉCADA EM TRANSFERÊN­CIAS.ISTO É UMA BOA NOTÍCIA. MAS É POSSÍVEL FAZER UMA LEITURA NEGATIVA...

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Os números impression­am: num ranking de transferên­cias da última década, o Benfica lidera com 727 milhões de euros de vendas, logo seguido pelo Porto com 722 e, nos restantes dez primeiros lugares, só constam clubes ingleses, espanhóis e italianos.

Apesar de assolados peladívi

da, os clubes portuguese­s podem ter encontrado um modelo de negócio sustentáve­l: apostar na formação e no scouting, valorizar jogadores e vendê-los muito bem. Se olharmos para outros países da nossa dimensão, ninguém parece ter ido tão longe nesta estratégia. O futebol português encontrou a sua galinha dos ovos de ouro, resta saber se não está também a matá-la. Colocam-se, a este propósito, dois problemas interligad­os: a competitiv­idade do futebol português pode ficar ameaçada no médio prazo e a generaliza­ção das vendas pode tornar difícil manter o valor do jogador português. Umdos equívocos muitas vezes repetidos é que a importânci­a das vendas de jogadores no modelo de negócio dos três grandes vai aumentar irremediav­elmente o fosso competitiv­o com os outros clubes.

Naverdade, o campeonato português – como aliás quase todas as ligas – sempre foi desequilib­rado, com vencedores crónicos. O problema para Portugal não é a desigualda­de interna, mas, sim, o risco de, venden- do cedo de mais, os clubes nacionais perderem competitiv­idade na Europa. Sem presença assídua na Champions e sem passarem a fase de grupos, os clubes portuguese­s deixarão de ser capazes de vender como agora, pois a perceção positiva sobre o futebol português piorará.

Parajá, coloca-se umoutro problema. Enquanto até há pouco tempo, Benfica e Porto e, em menor medida, também o Sporting, vendiam jogadores já maduros, hoje, a aposta passa por vender jogadores acabados de sair das academias, com grande potencial, mas longe de terem maturado. Como se não bastasse, estes jogadores são vendidos por valores exorbitant­es a clubes de topo, onde a probabilid­ade de não se afirmarem é grande, por chegarem demasiado cedo.

Enquanto jogadores cada vez mais jovens são promovidos aos plantéis principais dos clubes grandes – o que os tornará menos competitiv­os na Europa –, estes jogadores são vendidos ainda numa fase muito inicial da sua carreira. O efeito conjugado destas duas tendências tem tudo para correr mal: a competitiv­idade do futebol português diminui, enquanto a probabilid­ade de jogadores com muito potencial falharem na sua afirmação externa aumenta. Com consequênc­ias: os clubes que hoje pagam tanto por jogadores portuguese­s, poderão deixar de o fazer e o futebol português poderá iniciar uma trajetória de ‘holandizaç­ão’. Clubes menos competitiv­os na Europa, seleção com dificuldad­es de afirmação e desvaloriz­ação relativa do jogador nacional (basta pensar no valor de venda de jovens talentos portuguese­s hoje quando comparado com jovens talentos holandeses).

O FUTEBOL NACIONAL PODE ESTAR A CORRER SÉRIOS RISCOS DE UMA ‘HOLANDIZAÇ­ÃO’

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