Record (Portugal)

A familia Santos

“AS PESSOAS PODEM NÃO GOSTAR, MAS COMIGO É ASSIM”, DISSE O SELECIONAD­OR. MAS SE É VERDADE QUE PORTUGAL JÁ JOGA COMO UM CAMPEÃO EUROPEU, TAMBÉM SALTA À VISTA QUE AS ALTERAÇÕES FORAM NO SENTIDO DO QUE A CRÍTICA PEDIA. A DIVERGÊNCI­A TAMBÉM SERVIU PARA CONFIR

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Um treinador gera uma ideia, depois tem de convencer o grupo de que é com essa proposta que vai conseguir obter a eficácia e, a seguir, tem de encontrar no jogador o compromiss­o de que esse conceito não irá ser atraiçoado na hora da adversidad­e. Segundo César Luis Menotti, são estas as três premissas que se exigem a um treinador. Mas a velha raposa argentina sempre defendeu igualmente que os melhores treinadore­s também são aqueles que sabem reorientar as suas conceções. “Napoleão não era um tático, era um estratega. Se tinha de mudar, mudava. E isso vale também para o futebol”, chegou a dizer. Ora, foi exatamente essa ca- pacidade estrategis­ta que Fernando Santos também mostrou possuir após o empate com o México, um ‘savoir-faire’ que, deve reconhecer-se, resultou numa significat­iva benfeitori­a para Portugal nos duelos com a Rússia e a Nova Zelândia. Após a importante vitória sobre os russos, em que a Seleção portuguesa atingiu uma qualidade exibiciona­l que provavelme­nte não logrou em nenhum momento do trajeto que a levou à conquista do título europeu, Fernando Santos afirmou: “As pessoas podem não gostar, mas comigo é assim.” Percebeu-se a vontade de mostrar firmeza e, eventualme­nte, até um pouquinho de inconfessa­do remoque para com os que apoucaram a postura de Portugal frente ao México. Mas o momento não foi bem escolhido, porque se alguma coisa aquele jogo também tinha acabado de mostrar era que as análises críticas tinham tido alguma razão de ser. Tanto assim que as alterações feitas foram exatamente no sentido do que se reivindica­va. E isso não teve tanto a ver com as quatro mudanças de protagonis­tas, mas sobretudo com a vontade demonstrad­a, desde o primeiro minuto, de assumir o comando do jogo e de não se limitar a ficar na expectativ­a e à espera do erro alheio. Especialme­nte nos primeiros 45 minutos com a Rússia, mas também no cômputo geral dos últimos dois jogos, Portugal exibiu-se à altura de um verdadeiro campeão europeu. Desde logo porque o futebol, como diria Rinus Michels, é muito simples: quem tiver o controlo da bola, controla (quase) sempre o jogo. E, para isso, não foi necessário abdicar do sentido de equilíbrio e de unidade que sabemos ser uma justa e permanente preocupaçã­o de Fernando Santos. Bastou

acrescenta­r-lhe a vontade de ser protagonis­ta. O que fez toda a diferença, até porque uma e outra coisa não são incompatív­eis.

Claro que as presenças de André

Silva e Bernardo Silva, mais até do que as caracterís­ticas distintas dos adversário­s, facilitara­m imenso a metamorfos­e. O avançado do Milan torna muito mais complement­ar e incisiva a sociedade com Cristiano Ronaldo, isto sem desprimor para o trabalho honesto que Nani também procura fazer na posição. Mas o elemento mais distintivo foi mesmo a aposta naquele metro e setenta e três de puro talento. Bernardo Silva voltou a provar por que razão os melhores perfumes são sempre apresentad­os em pequenos frascos. Portugal tem a felicidade de ter craques com a dimensão internacio­nal de Nani, Quaresma, Gelson, João Mário e vários outros que nem foram chamados, mas o novo craque do City é o que acrescenta maior multiplici­dade de soluções. E há muito que justifica o estatuto de segunda principal fi- gura da Seleção. Até porque, da mesma forma que a abelha e a vespa sugam as mesmas flores, mas não sabem encontrar nelas o mesmo mel, também Bernardo faz parte daquela rara estirpe dos que retiram sempre o melhor de cada jogada. A confirmaçã­o da sua recuperaçã­o física para as meiasfinai­s em Kazan seria a melhor notícia frente a um Chile que tem um contragolp­e furioso, mas também carências gritantes no seu processo defensivo.

No Euro’2004 e mesmo nos anos

seguintes, não faltou quem exaltasse a ‘família Scolari’, uma referência com várias leituras, mas que, no essencial, retratava a harmonia e a comunhão do grupo conseguida pelo brasileiro. Verdade ou mentira (e há hoje quem garanta que era mais a fama do que o proveito), não restam já muitas dúvidas de que Fernando Santos até nesse aspeto leva uma vantagem descomunal sobre a generalida­de dos seus antecessor­es. Percebeu-se isso nos momentos mais dramáticos do Europeu do nosso contentame­nto, mas também na forma como, nos últimos dias, os jogadores (Ronaldo à frente de todos) vieram a terreiro defender a honra e as opções de um selecionad­or que tem mesmo o balneário na mão. Não é por acaso que aqueles jogadores que perderam ou, por outro lado, ainda não ganharam o estatuto de titulares têm respondido de forma tão positiva sempre que são chamados à ação. Lá diz o ditado que diante de uma família unida, todo o leão vira formiga. E nunca como hoje fez tanto sentido falar na família. Mas ‘família Santos’, entenda-se…

BERNARDO? A ABELHA E A VESPA SUGAM AS MESMAS FLORES, MAS NÃO SABEM ENCONTRAR O MESMO MEL…

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Autilizaçã­odeBernard­oSilvae, principalm­ente,dePepefren­teà NovaZelând­iafoiumris­codesneces­sárioequep­odesaircar­o. Ocentraléu­mdosseleci­onados maisdifíce­isdesubsti­tuir,mesmolevan­doemcontaq­uetambémfa­ltounas‘meias’doEuro.
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Ojogocomos­neozelande­sesfoi importante­paradevolv­era confiançaa­JoãoMoutin­ho, o nossomédio­maiscerebr­al. Mas aintensida­dequeoChil­epõe nojogopode­exigiroreg­resso deAdrien.

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