Record (Portugal)

Há falta de ‘catenaccio’ e sobra barbárie

- Alexandre Pais Ex-Diretor Record

CIVILIZAÇíO EM OLD TRAFFORD E BARBÁRIE À SOLTA EM ALVALADE E NO RESTELO NÃO SE ENTENDE COMO FOI POSSÍVEL QUE O RIO AVE, ESTANDO A GANHAR NA LUZ AO INTERVALO, ENTRASSE PARA A SEGUNDA PARTE SEM ALTERAR A SUA ESTRATÉGIA

Por muito que o por vezes irritantem­ente otimista discurso de Rui Vitória o negue, os recentes acontecime­ntos que mantêm, com razão ou sem ela, o nome do Benfica nas manchetes generalist­as fazem os jogadores sentir o peso da responsabi­lidade acrescida que chega de fora: os encarnados precisam desesperad­amente de ganhar – por causa do penta e do resto. Na partida com o Rio Ave, depois de uma primeira parte dececionan­te, a equipa reencontro­u-se no segundo tempo e goleou, deixando-me duas simples interrogaç­ões: por que não joga Rafa com regularida­de? Por que não vemos Raúl Jiménez mais vezes como titular? O golo do mexicano, parecendo fácil, fez lembrar Luis Suárez ou Lukaku, pela espon- taneidade no remate que define os pontas-de-lança.

A propósito do Benfica-Rio Ave,

volto a um tema que desenvolvi, há duas semanas, na minha página da ‘Sábado’: a passagem do técnico ítalo-franco-argentino Helenio Herrera, um dos grandes treinadore­s da história – com resultados fantástico­s no Barcelona e no Inter –, por Portugal e pelo Belenenses. HH só optava pelo futebol de ataque quando dispunha de artistas para o pôr em prática e sabia como poucos tapar os caminhos para a baliza das suas equipas – ou não fosse ele um dos mais fiéis intérprete­s do célebre ‘catenaccio’, de Nereo Rocco. Mal se apanhasse a ganhar, em especial com adversário­s fortes, aplicava o plano B e era uma chatice. Recordo-o porque não compreendo como é possível estar a vencer na Luz o Benfica, ao intervalo, e entrar para a segunda parte sem alterar o esquema tático, na tentativa já não digo de triunfar, mas ao menos de não levar ‘chapa 5’. Ainda se fosse uma equipa do fundo da tabela... mas o quinto classifica­do?

Já tinha acontecido na última assembleia geral do Benfica e

voltou a suceder agora com as de Sporting e Belenenses. Em Alvalade, o ‘savoir faire’ de Jaime Marta Soares parou a festa quando sobraram os insultos, enquanto no Restelo os sócios chegaram mesmo a vias de facto. Não me vou alongar em consideraç­ões, apenas referir os factos na esperança, ténue, de que algum dia haja vergonha.

Emcontraci­clo com a barbárie,

saliento o comovente minuto de silêncio com que Old Trafford assinalou, no sábado, antes do jogo com o Huddersfie­ld, a passagem de 60 anos sobre a queda do avião que vitimou oito jogadores do Manchester United e mais 15 passageiro­s, a 6 de fevereiro de 1958, em Munique. As câmaras de TV focaram em particular um dos sobreviven­tes, o já lendário Bobby Charlton, hoje com 80 anos, perante o impression­ante silêncio das bancadas. Refiro essa homenagem porque entre nós, desgraçada­mente, um momento desses logo seria manchado pelos urros e assobios de uns quantos anormais. Como se tem visto nos últimos tempos – em recintos desportivo­s, zonas de acesso aos estádios ou assembleia­sgerais – a civilizaçã­o tarda em instalar-se em Portugal. E será que chega algum dia?

 ??  ??
 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Portugal