Record (Portugal)

Rei Artur no topo da Europa

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Quando fraturou uma perna, em treino do Belenenses, nos alvores da temporada 1977/78, já era muito mais do que o crepúsculo de um dos melhores pontas-de-lança da história do futebol nacional: era um fantástico projeto como treinador. Tinha 31 anos e uma carreira marcada por várias lesões; sabia que acabara como futebolist­a e fez-se à estrada, seguro de que precisava de preencher o disco rígido do conhecimen­to, com a convicção de que o tempo jogava a favor dos seus interesses. O primeiro instinto atirou-o para o frio longínquo de Leipzig, na então RDA, onde tirou curso que lhe permitiu consolidar competênci­as e cimentar a certeza de que o futuro passava pelo treino. Não menos importante, no exterior desenhou-se com clareza a ideia de que estava a construir-se um dos melhores treinadore­s portuguese­s de sempre, perspetiva criada a partir de qualidades intelec-

ARTUR JORGE INTERPRETO­U A ESCOLA E ADAPTOU-A ÀS EXIGÊNCIAS TÁTICAS E FÍSICAS DOS ANOS 80

tuais conhecidas e da previsão, com margem de erro reduzida, da referência em que podia tornar-se.

No regresso a Portugal, José Maria Pedroto fez dele seu adjunto no V. Guimarães e com o Mestre concluiu a formação do enorme treinador em que viria a tornar-se. No Belenenses deu os primeiros passos a solo (sem sucesso), mas duas temporadas no Portimonen­se foram suficiente­s para confirmar indicações. Quando chegou às Antas, no verão de 1984, com 38 anos, estava preparadís­simo para o grande desafio. Era uma conjugação apetecível de estudo académico, saber empírico e pupilo dileto de Pedroto. Assente no estilo da escola portuguesa, Artur Jorge modernizou a es- tética, suavizou o discurso, adaptou a ideia às exigências táticas e físicas dos anos 80 e deu resposta cabal às necessidad­es do que se propôs con- seguir: ganhar e encantar plateias. Nesse processo de afirmação cultivou alguma distância com os jogadores, altivez que não beliscou o essencial: entre outras conquistas, foi campeão europeu em 1987 – o primeiro treinador português a consegui-lo. Seguiu-se o apelo do estrangeir­o (projeto frágil no Matra Racing) e o regresso a casa, para voltar a ser campeão pelo FC Porto. Mas foi em 1991, de volta a Paris, agora ao PSG, que Artur Jorge completou o puzzle como um dos melhores treinadore­s do seu tempo: venceu uma liga francesa e assinou sucessivas presenças de luxo nas competiçõe­s europeias. Já tinha conquistad­o a Europa, tornou-se então Rei Artur em Paris e no Mundo. Cumpriu depois o sonho de treinar o Benfica. A paixão não foi retribuída e acabou saindo pela porta dos fundos, depois de viver período difícil, vítima de grave doença. Como selecionad­or falhou a qualificaç­ão para o Mundial’98 e, desde então, entregou-se a peregrinaç­ões menores, que não fizeram justiça ao enorme talento e à notável história como treinador. *

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DOMINADOR. Quando assumiu o comando do FC Porto, Artur Jorge tornou-se uma figura central do futebol português

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