A toupeira escancarada (parte I)
NÃO SEI SE TODAS AS MANOBRAS CONHECIDAS TIVERAM OU NÃO IMPACTO SOBRE A VERDADE DESPORTIVA, MAS SEI QUE O BENFICA DECIDIU JOGAR COM REGRAS DIFERENTES DOS RESTANTES CLUBES
Esta operação E-toupeira, tem algumas semelhanças com a Operação Marquês, que envolve o ex-primeiro ministro José Sócrates. Em dois aspetos. O primeiro pode definir-se como o do descrédito ético.
Não sei se José Sócrates vai ser
condenado pela prática dos crimes de que o acusam; utilizando linguagem desportiva, dir-se-á que ainda há muito jogo para jogar e que o resultado está em aberto. Mas se do ponto de vista jurídico ainda podem subsistir dúvidas, no plano ético é inquestionável que a maioria das pessoas já fez os seus juízos.
Com efeito, a publicação das escutas relativas a José Sócrates, de alguma forma, torna difícil de conciliar as teses do di- nheiro do amigo, da pobreza patrimonial e da perseguição contra a sua pessoa.
Ou seja, a prática de um ato de
legalidade discutível ( embora para mim não seja), como a divulgação das escutas, permitiu ao cidadão comum ocupar um lugar nos bastidores e perceber o quanto é encenação e a distância que a separa da versão que o próprio reiteradamente sustenta.
O conhecimento da verdade
permitiu a cada um extrair as suas conclusões éticas, quanto ao caráter e idoneidade do visado. ‘Mutatis mutandis’, o mesmo se passa com o Benfica.
Pode questionar-se o ato que permitiu ter acesso à correspondência eletrónica, mas não se pode proibir obviamente o juízo que, a partir do conhecimento da mesma, as pessoas façam.
Aqui também não se sabe se o Benfica, os seus dirigentes e representantes serão condenados, à luz do Direito; mas no tribunal da opinião pública já há matéria abundante, que permite um veredicto.
Asensação que dá é que o Benfica, de algum modo, enterrou o fair play.
Não sei se todas as manobras que agora são trazidas à luz, tiveram ou não impacto sobre a verdade desportiva; sei, sim, que este novo ‘modus operandi’, esta queda por circuitos paralelos e ocultos, mostra que o Benfica decidiu jogar com regras diferentes dos restantes clubes. O que não quadra muito bem com uma instituição que beneficia do estatuto de utilidade pública.
Como Sócrates, bem pode o Benfica proclamar a sua inocência, bem pode lastimar-se de ser vítima e não culpado, bem pode arvorar-se em mártir de violação do segredo de justiça e da devassa informática; só que esse discurso não preclude aquilo que as pessoas já ficaram a conhecer, e, tal como Sócrates, é tarefa bem difícil fintar a realidade.
Perante isto, o branqueamento do comportamento de Paulo Gonçalves é como a história do amigo do peito, que empresta dinheiro a José Sócrates; já não convence ninguém.
O CONHECIMENTO DA VERDADE PERMITE A CADA UM TIRAR AS SUAS CONCLUSÕES ÉTICAS