Record (Portugal)

“FILHO DO KADHAFI QUIS-ME NA SELEÇÃO”

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Asualiga ão ao Mourinho terminou quando ele foi para o Inter. O que se passou?

BB - Houve um atrito banal entre nós… E foram sete anos desgastant­es. Talvez houvesse também algum cansaço. Já não fui com ele para Itália, mas ainda estive dois anos a fazer trabalho de observação de jogadores e de equipas adversária­s, mas não era o que eu gostava mais de fazer. Eu gosto é de estar no campo.

O José Mourinho também parece ser uma pessoa bastante temperamen­tal. Daí também esse desgaste?

BB - Um treinador tem de ter aquela capa de proteção, às vezes tem de ter intervençõ­es públicas mais fortes e marcantes. Fora do trabalho ele não era assim. É pessoa de fino trato, mas sabia que o trabalho dele também passava por aquilo. Melhor do que ninguém, ele sabe que às vezes tem de ser forte. Quando se trabalha com homens e debaixo de muita pressão, tem de se ser assim. Foi uma época marcante para o FC Porto e para o futebol português. O Mourinho marcou um ciclo. Há um antes e um pós-Mourinho. Depois dele apareceram outros com mais qualidade porque começaram a pensar mais o jogo e o treino. Daí este sucesso de tantos treinadore­s portuguese­s. O Mourinho abriu as fronteiras aos treinadore­s portuguese­s, mas também aos jogadores.

Após terminada essa ligação, o Baltemar Brito foi para a Líbia como treinador principal. Isso é que foi coragem... BB - Tive duas passagens por lá. Na primeira vez, demorei 15 dias para assinar o contrato porque estavam todos a dizer que eu não tinha sido adjunto do Mourinho, que aquilo era tudo montagem. Ninguém me queria lá. Só o filho do Kadhafi conseguiu que eu ficasse. Ele não era o presidente, mas mandava no clube. Só pediu para eu não o desiludir. Fiz 13 jogos, ganhei 11 e empatei 2. O filho do Kadhafi até me quis para selecionad­or. Falou comigo numa sexta-feira, mas na terça-feira seguinte eu tive de fugir do país quando começou a guerra. Eu, a minha mulher e a minha filha de 8 meses, tivemos de vir num avião da Força Aérea que, quando chegou a Portugal, ‘caiu’ em vez de aterrar. Um avião duro, sem ar condiciona­do, sem água… Foi uma experiênci­a terrível.

Mas se voltou para a Líbia, é porque tinha gostado da primeira experiênci­a.

BB - As coisas correram-me realmente bem, eu adapto-me com facilidade. Por exemplo, usava um crucifixo ao pescoço, mas eles alertaram-me para aquilo e disseram-me que não o devia usar. Eu respeitei, claro. Lá também anda tudo dependente das rezas. Quando cheguei à Líbia, os treinos eram interrompi­dos para as pessoas rezarem. Tive de mudar os horários, ou começava mais cedo ou começava mais tarde os treinos, porque não queria ter de parar o trabalho a meio para eles irem rezar. Depois mudou-se para os Emirados Árabes Unidos…

BB - Aí foi melhor. É um país árabe, mas com um regime quase ocidental. Não vemos situações muito rígidas em termos culturais ou religiosos. Fui para um clube da 2ª Divisão, ganhei a Taça das Confe- derações, mas o caricato é que depois perdi um jogo e fui despedido. A direção tinha pago um milhão de euros pelo empréstimo de um jogador brasileiro e queriam que eu o promovesse logo a capitão. Ele não falava árabe, nem sequer inglês… Tinha jogadores no clube há sete ou oito anos. Não era esse brasileiro que ia representa­r bem o clube. Disse isso ao presidente e ele não aceitou. Após essa derrota, fui despedido.

Em 2013 volta ao Brasil, de onde saiu como jogador em 1974 para vir jogar para o V. Guimarães... BB - Fui para o Grêmio Osaco para disputar a Série B do Paulista. Muitas vezes pensei que gostava de voltar para lá, mas cometi um grande erro. Ao contrário das outras experiênci­as, nesta não levei qualquer adjunto. Cheguei lá com as minhas ideias sobre a periodizaç­ão tática. Gosto que todo o tipo de trabalho seja feito com bola, mas eles não pensam assim. Querem o trabalho analítico feito à parte, depois o trabalho no ginásio e ainda gostam muito que os jogadores fa- çam trabalho pesado. O meu adjunto falava nas minhas costas e dizia à direção que os jogadores não andavam a treinar-se o suficiente. Tivemos uma série de jogos muito boa, mas depois perdemos dois jogos e a equipa técnica começou a tentar influencia­r os jogadores. Saí porque senti que tinha perdido a minha autoridade e porque não estava feliz. Quem me criticou, orientou a equipa em quatro jogos. Perderam os quatro!

E agora o Luxemburgo porquê?

BB - Não sou pessoa de estar parada. Gosto muito de futebol e, como costumo dizer, nós escolhemos os sítios onde vamos passar férias, mas não para onde vamos trabalhar. Trabalhar é onde aparece e eu gosto de estar em atividade. Tenho um amigo no Luxemburgo e cruzei-me com o Fangueiro, que é o diretor desportivo do Pétange, num jogo em Guimarães. Conver-

TREINADOR CONTA EPISÓDIOS INSÓLITOS DA FORMA COMO FOI DESPEDIDO NOS EMIRADOS ÁRABES UNIDOS E ATÉ NO BRASIL

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