"SEM DANILO TEREI DE LEVAR OITO DEFESAS"
Fernando Santos “Ronaldo é um animal”
O selecionador já pensa nos 23 para o Mundial. Diz que só há um indiscutível (CR7), admite não convocar alguns campeões europeus e revela o desencanto de não poder levar só três centrais à Rússia
que fase se encontra a escolha dos 23 jogadores para o Mundial?
FERNANDO SANTOS – Está na fase dos 35 (risos)… Seria utópico, a tão curta distância da competição, não ter uma ideia global; mas também é verdade que há coisas que não podemos prever, logo é muito contingente falar sobre esse tema. Esta questão do Danilo, por exemplo, mostra-o claramente, porque alterou muito os meus planos. As pessoas podem dizer que ele nunca foi um titular indiscutível da Seleção, o que é verdade; mas foi sempre titular indiscutível dos 23. Foi-o pela qualidade como jogador, pelo seu perfil e caráter, mas também por um conjunto de fatores importantes, desde logo a possibilidade que me dava de levar três centrais.
Muita coisa mudou a partir do impedimento dele?
FS – Não há outro jogador que, sendo médio, me possa fazer de central em caso de necessidade. As características dele são muito diferentes de todos os outros jogadores da sua posição. Quando disse, numa das últimas conferências de imprensa, na anterior concentração, que tinha 70% dos convoca- dos mais ou menos definidos e que Danilo e Pepe não estavam ali mas podiam vir a estar, equacionei a opção de levar sete defesas. Neste momento é uma decisão que está praticamente tomada: em princípio, terei de levar oito defesas. Não é definitivo mas é uma indicação. E temos de encarar assim o problema, porque esta é uma fase atípica da época e, até ao fim, ainda muita coisa pode acontecer.
Ainda não é tempo de dar prioridade à escolha dos 23?
FS – Por estes condicionalismos, em vez de me centrar nos 23, embora alguns só por lesão deixarão de lá estar, estou mais focado nos primeiros 35.
Porquê 35?
FS – Porque as regras mudaram. Antes tínhamos de mandar um lote de 30 jogadores mas, depois de várias conversas com a UEFA, conseguimos aumentar o número para os 35 de que falei – os selecionadores queriam que fossem 40 mas foi-nos recusada a pretensão. As regras são estas: os 23 têm de estar neste lote; mas se um destes se lesionar e for comprovadamente impedido de estar no Mundial, nessa altura já podemos escolher um jogador que não esteja nesses 35.
Pode dizer-se que a escolha para o Mundial está a ser mais difícil do que a do Europeu?
FS – Não, não se pode dizer isso.
Numa análise breve, dá a sensação de haver mais opções…
FS – Não me parece. Portugal tem muitas opções, é inegável, como todos sabemos, mas é preciso não esquecer que, para o Campeonato da Europa, há dois anos, houve vários jogadores que à partida estariam no lote dos convocados e que deixaram de estar – Tiago, Danny, Bernardo Silva, entre outros. Se alguns desses jogadores estivessem disponíveis, teriam causado muitas dificuldades na convocatória para o Europeu. A esta distância não nos lembramos das dificuldades então criadas, com o afastamento de alguns jogadores que muito contribuíram para a presença em França, à semelhança do que sucedeu agora com o Danilo.
Não tem mais dúvidas agora? FS – Tenho as mesmas. O meu critério não se pode basear apenas se os futebolistas convocáveis estão ou não a jogar; sou muito confrontado com essas considerações,
“A LESÃO ALTEROU OS MEUS PLANOS: NÃO HÁ OUTRO JOGADOR QUE, SENDO MÉDIO, ME POSSA FAZER DE CENTRAL”
pelo público em geral mas também por vocês, jornalistas. Sobre esse tema direi que, se essa for a única base de escolha, iremos convocar poucos jogadores. Tem de haver alguma maleabilidade nos princípios que nos orientam. Daqueles que, por norma, fazem parte desta equipa, mesmo sabendo que não há titulares ou convocados indiscutíveis, há um lote de jogadores que me acompanha desde o início e tem jogado menos nesta época. E essa não é uma questão menor.
Podemos considerar que João Mário é o caso mais preocupante? FS – João Mário é um exemplo. Agora está a jogar mais no West Ham, a situação está a compor-se, mas esteve muito tempo parado no Inter. A grande verdade é que há muitos jogadores de Seleção que não têm atuado com a assiduidade que eu gostava. Nesses casos devo ter critérios de avaliação mais abrangentes: o que eles me podem dar, o conhecimento que têm da própria equipa e a melhor forma de promover a organização estrutural dos 23. Esse é um problema central: ao treinador compete analisar as coisas de uma forma estratégica e segundo os seus parâmetros, atendendo à ideia que tem. Compreendo o ângulo de visão dos adeptos e até o vosso – eu também leio jornais, vejo televisão e aceito todas as opiniões… Quer dar um exemplo?
FS – Vamos escolher os dez melhores jogadores da Liga, para cuja chamada haverá certamente bons motivos. Imaginem que são dez avançados. De que me serve isso se eu só vou levar três ou quatro? Tenho é de promover um equilíbrio entre os elementos ao meu dispor que me permita resolver as situações que eu espero encontrar perante os adversários que vou enfrentar. A análise tem de ser feita assim.
Os confrontos com Egito e Holanda ajudaram a dissipar algumas dúvidas? FS – Não, não… Quando convoquei aqueles jogadores não tinha dúvidas; convoquei-os porque entendi que havia alguns elementos que, tendo já estado connosco, devia vê-los mais uma vez. De resto, disse-lhes logo, quando chegaram, que aqui não havia ninguém em teste. Não faria qualquer sentido dizer que tenho 35 jogadores prontos para qualquer eventualidade, mais três ou quatro que podiam perfeitamente ser considerados também, e vir falar em testes quando chamo jogadores menos óbvios. Todos devem estar preparados para a chamada…
FS – Claro. Ainda que sendo doloroso, para ele e para nós, o Danilo é um grande exemplo, porque, pelas suas características, dificilmente é substituível por outro jogador – é atleticamente muito possante e fortíssimo no jogo aéreo. Nunca poderemos fazer uma substituição direta. Temos agora de analisar, face ao plano estratégico de jogo, quais são os que melhor podem responder.
O afastamento do Danilo pode representar a chamada de mais um jogador? FS – Precisamente. Trata-se de uma decisão estrutural que mudou a análise, desde logo a necessidade de levar oito defesas. Com o Danilo podia levar só três centrais. *
“NÃO FARIA SENTIDO DIZER QUE TENHO 35 ELEMENTOS, E FALAR EM TESTES QUANDO CHAMO JOGADORES MENOS ÓBVIOS”