Record (Portugal)

Treinar a mente

- Susana Torres

Uma das coisas que os atletas me pedem quando iniciamos um trabalho em Alta Performanc­e é aumentar o foco, de forma a abstraírem-se daquilo que os distrai e poderem obter mais eficácia nos resultados. Foco é das coisas mais desejadas no desporto e conseguir treinar esta capacidade está ao alcance de qualquer atleta. Por isso, é importante entender o SAR – Sistema de Ativação Reticular –, uma rede de vias nervosas, localizado no tronco do cérebro, que filtra todos os dados sensoriais que recebemos do mundo exterior. O cérebro processa cerca de 400 milhões de bits de informação por segundo, sendo que apenas 2000 são processado­s ao nível do consciente. O que acontece ao resto da informação? Ela é processada pelo subconscie­nte sem que nos apercebamo­s disso. Isto significa que 99,9999 por cento da informação nos passa completame­nte ao lado. O SAR é o grande responsáve­l pela filtragem da informação, decidindo o que é relevante a cada momento. Tem a mesma função da triagem num hospital, trazendo para o consciente o que é prioritári­a. É por isso importante perceber que a regra que se aplica no momento de filtrar a informação é linguístic­a, ou seja, aquilo que dizemos a nós próprios, as afirmações que proferimos e os pensamento­s dominantes que habitam na nossa cabeça são determinan­tes. Se quero ganhar mais foco, preciso definir o que penso e o que digo para que o SAR selecione aquilo que me interessa a cada momento. Um dos métodos que uso com os meus atletas é a elaboração do ‘SCRIPT’ de jogo. Nele estão definidas as coisas onde queremos colocar a nossa atenção. Ele é escrito e lido vezes sem conta, para que o SAR inicie uma atenção profunda a toda a infor- mação relevante e relacionad­a com o ‘SCRIPT’. As afirmações que constam no ‘SCRIPT’ são referidas várias vezes e todo o treino de visualizaç­ão tem por base essas mesmas afirmações. Escrevemos onde queremos colocar a atenção, dizemos em voz alta e visualizam­os as respetivas ações. No fundo, aquilo que pretendemo­s é condiciona­r o SAR para que este selecione informação que nos irá potenciar a performanc­e. O que acontece muitas vezes é que em vez de colocarmos a atenção naquilo que queremos, colocamos naquilo que não queremos que aconteça. Por exemplo, dizendo “não quero perder” quando na verdade o que deveríamos dizer é “quero ganhar”. Ambas as afirmações parecem ter a mesma intenção, no entanto a forma como afetam e condiciona­m o SAR é totalmente oposta. “Não quero perder” é uma informação que colocará o SAR focado em perder, encontrand­o situações que validem esta informação. Ao passo que quando digo “quero ganhar”, o SAR vai orientar a filtragem da informação para as soluções e oportunida­des que me farão atingir este objetivo. Talvez agora entendas por que quando achas que algo vai correr mal, corre mesmo!

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Concentraç­ão é crucial

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