Record (Portugal)

Um campeonato limpo

SÉRGIO CONCEIÇÃO FOI CAPAZ DE TRANSFORMA­R FRAQUEZAS EM FORÇAS E MONTOU UMA EQUIPA COM UM FUTEBOL VERTICAL, À MEDIDA DO CAMPEONATO PORTUGUÊS

- Pedro Adão e Silva Professor Universitá­rio

O Porto é um justo campeão, numa temporada em que se revelou superior e que teve em Sérgio Conceição, contra a expectativ­a de muitos (entre os quais o autor destas linhas), o grande protagonis­ta. Foi o treinador do Porto que foi capaz de transforma­r fraquezas (um clube impedido de investir) em forças (um grupo unido, no qual jogadores proscritos foram decisivos). Mais, do ponto de vista tático, Conceição montou uma equipa com um futebol vertical, à medida do campeonato português.

Reconhecer isto é reconhecer o óbvio. Como é igualmente óbvio que este foi um campeonato limpo em campo, no qual as arbitragen­s, no final, desempenha­ram um papel marginal nas contas do título. Que o Ben- fica não reconheça isto, naturalmen­te que me entristece. A pior coisa que poderia acontecer ao Glorioso era transforma­r-se, agora, numa caricatura de dinâmicas de comunicaçã­o risíveis e degradante­s que, tantas vezes, critiquei nos nossos adversário­s.

Falar das arbitragen­s é, invariavel­mente, uma forma de esconder as próprias incapacida­des e tem riscos acrescidos. Uma coisa é, agora, o Benfica, por exemplo, queixar-se de Carlos Xistra no dérbi para atirar areia para cima dos olhos de uns quantos adeptos mais obnubilado­s; outra, bem distinta, é se a própria estrutura se convence que o Benfica não venceu em Alvalade por causa do árbitro ou, pior, que falhou o penta por força das arbitragen­s. O grande problema das arbitragem, em Portugal hoje, é a incompetên­cia e a fraca qualidade. Ao contrário do passado, está longe de ser o favorecime­nto a este em detrimento daquele. Ao sugerir que este foi um campeonato sujo, o Benfica, para além de procurar ocultar os seus próprios falhanços em campo (esta temporada, em dez jogos a doer, tirando os confrontos com Braga, entre clássicos e Champions, a equipa fez três pontos e marcou, apenas, um golo ao CSKA e outro, de penálti, ao Sporting), está, de facto, a reproduzir a narrativa de Porto e Sporting das temporadas passadas e, assim, a contribuir para desvaloriz­ar as conquistas que nos levaram ao tetra.

AO DIZER QUE FOI UM CAMPEONATO SUJO, O BENFICA ESTÁ A OCULTAR OS PRÓPRIOS FALHANÇOS

Estamos, de facto, a entrar num ciclo vicioso, em que nos é garantido que ninguém vence um campeonato em campo. Pelo contrário, as vitórias dependem da capacidade de pressionar árbitros, da eficácia com que se disseminam factos alternativ­os para, depois, se promover a gritaria em debates televisivo­s. No fim, deve restar o caldo perfeito para alguns, poucos, lucrarem com os negócios em torno do futebol, com a turba, bovinament­e, a aplaudir.

Para contrariar este estado de coisas, espero que o Benfica se dedique a fazer o que – com custos muito significat­ivos – não cuidou de fazer há um ano: concentrar-se em construir um plantel capaz de ser superior em campo.

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