“Para o Sérgio bater o meu recorde tem de ganhar Liga e Champions”
Sérgio Conceição está agora a começar o ciclo no FC Porto, deve também continuar?
JM – O Sérgio já tem uma boa experiência como treinador, inclusivamente com uma passagem por França. Como jogador tem um capital de experiências seguramente útil para a sua carreira de treinador. Está num patamar diferente.
Esta época, o FC Porto de Sérgio bateu o seu recorde de pontos.
JM – Não bateu nada. Para bater o meu recorde tinha de vencer a Liga e a Champions [risos]. Até poderia ter somado o dobro dos pontos, mas para bater o meu recorde tem de ser campeão e ganhar a Champions no mesmo ano ou no ano anterior ganhar o campeonato, a Taça e a Liga Europa.
Acha que é possível um clube português repetir essa proeza? JM – Difícil sim, impossível não. Continuo a lembrar, quando tenho oportunidade, que a equipa do FC Porto que ganhou a Champions tinha nove portugueses no onze. Nove! E cinco ou seis deles jogavam na época anterior no Setúbal, Leiria, Guimarães, Boavista. E foi possível.
Esta época do Sérgio Conceição foi uma época à Mourinho? JM – Nalguns aspetos, sim. A equipa foi unida, soube ultrapassar um par de momentos difíceis, como quando perdeu o 1º lugar. O treinador sempre ao lado dos jogadores, o presidente também… A figura do Eng. Luís Gonçalves foi, presumo eu, aglutinadora, pois é um homem experiente. Os adeptos também se percebeu que queriam mais do que nunca. Àquele mar vermelho que empurrou o Benfica para o tetra sucedeu o mar azul. Até nos mais pequenos detalhes se manifestou, desde a chegada ao aeroporto à partida para Lisboa, o treino à porta aberta. Acho que a reação à goleada sofrida com o Liverpool foi um ponto marcante da união equipa-adeptos. Uma derrota em casa por 5-0 é pesada. O Sérgio aguentou, obviamente porque foi suportado. porque nesse aspeto o FC Porto é grande. Eu senti isso nos dois anos em que lá estive. Foram juntos até ao fim. O Benfica fez recuperação fantástica mas caiu quando não podia cair; o Sporting criou uma linha de estabilidade mas sem passar para a luta direta pelo título.
O Sérgio diz que foi um dos campeonatos mais importantes conquistar nos últimos 30 anos. Concorda? JM – Nesse aspeto também foi parecido com o meu primeiro campeonato. Quando entrei, havia um vazio de êxitos e mesmo no primeiro ano não ganhámos. Sem ser quebrar a hegemonia do Benfica, também na altura se quebrou um ciclo de insucesso. Naquele clube sentes que as pessoas não convivem bem com o não ganhar. E eu senti-me como peixe na água. Lendo o Sérgio de fora percebo essa arrogância positiva. O FC Porto enveredou por um caminho esta época que até o próprio estilo de jogar da equipa adaptou-se a isso mesmo. Não foi uma equipa artística mas criou empatia com o adepto. O adepto gosta de ganhar mas também gosta de sentir a velha máxima do amor à camisola, ou pelo menos, à paixão pelo jogo. O FC Porto transmitiu isso. Foram rapazes lutadores, com dose grande de agressividade, jogaram sempre em alta rotação, chegavam ao fim do jogo espremidos pelo seu esforço.
Quando o treinou, viu-lhe qualidades para ser treinador?
JM – Não, porque nessas alturas os jogadores dizem todos que não vão ser treinadores. E não se consegue prever quem vai ser ou não. Às vezes, tens surpresas grandes na modificação do caráter e o jogador que era preguiçoso e indis
“A EQUIPA FOI UNIDA, SOUBE ULTRAPASSAR UM PAR DE MOMENTOS DIFÍCEIS, COMO QUANDO PERDEU O 1º LUGAR”
“O ADEPTO GOSTA DE GANHAR MAS TAMBÉM DE SENTIR O AMOR À CAMISOLA OU, PELO MENOS, À PAIXÃO PELO JOGO”
ciplinado, torna-se no treinador exigente e disciplinador. Era difícil prever. O Sérgio fez o seu percurso, nada lhe foi dado de bandeja, esteve fora, esteve dentro, lutou para não descer e pela Europa e regressou ao FC Porto para assumir uma responsabilidade que nem todos sabem viver. Às vezes perguntam-me: este treinador é bom? E eu respondo: é bom para que clube? *