Record (Portugal)

O dia em que o meu relógio parou

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quele momento era brutal. As conversas terminaram e reinava o silêncio. Cada um estava nos seus rituais pessoais enquanto alongávamo­s e fazíamos alguns exercícios. As úni- cas palavras que conseguia dizer aos meus companheir­os eram “Vamos ganhar!”. Bastava o som da respiração de cada um e o ruído dos pitões no cimento quando caminhava e para per- ceber perfeitame­nte que nunca tinha vivido um momento tão intenso como aquele. Sabia que o jogo que ia disputar era mesmo muito especial e algo grandioso. Estava louco para sair com Portugal. Joguei muitos dérbis e clássicos em vários países e todos eles foram batalhas psicológic­as de alta tensão e pressão, em que as horas, minutos, e segundos prévios ao apito inicial do árbitro custavam uma barbaridad­e a passar. Mas naquele 27/05/1987 o relógio congelou completame­nte.

FAZ HOJE 31 ANOS QUE VIVI O DIA MAIS LONGO DA MINHA VIDA. OS PONTEIROS DOS MINUTOS E SEGUNDOS ESTAVAM CONGELADOS. E SÓ ACELERARAM AO INTERVALO, NA PALESTRA DE ARTUR JORGE

rapidament­e passaram naquele dia foram ao intervalo, quando estávamos a perder 1-0. A palestra de motivação do nosso treinador Artur Jorge foi assim: “Meus senhores, levantem a cabeça e olhem para mim. Têm 45 minutos para entrar na história. Isto não é um sonho. Isto está a acontecer e é a realidade. Vocês são melhores do que eles”, disse. Fez uma pausa e acrescento­u: “Estão a 45 minutos de entrar na história. Por isso, vamos dar a volta a isto e vamos ganhar o jogo.” E repetiu: “Olhem bem para mim.” Todos olhámos e ele repetiu várias vezes em voz alta: “Têm quarenta e cinco minutos para entrar na história.”

Faz hoje 31 anos que entrámos na história, mas também faz 31 anos que vivi o dia mais longo da minha vida.

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