À ESPERA DE MAIS UM TIRO
No 10 de julho de 2016 estávamos os dois, no lado direito da tribuna de imprensa, a sorrir depois do remate histórico do Eder. Os jornalistas portugueses estavam à esquerda. Os franceses à direita e Sylvia, a minha colega do ‘Parisien’, de sangue português, atrás de mim. Um pequeno ‘clap’ entre nós, com as mãos, para comemorar este momento histórico. Para mim, o momento mais alto de uma história de 16 anos que começava, também, com um remate extraordinário. No 12 de junho de 2000, estou no Philips Stadion, em Eindhoven, na Holanda, para cobrir o Inglaterra– Portugal. Tenho 26 anos, é o meu primeiro Europeu, um ano após a minha entrada na redação do jornal ‘L’Équipe’. É igualmente o meu primeiro jogo deste nível. Estou encarregue da Seleção portuguesa e de duas outras menos mediáticas. Não conheço muito do futebol português, não falo nada da língua. Todos os meus companheiros mais velhos se aproximam de mim antes do início do jogo e dão-me um pequeno toque nas costas, por duas vezes. A Inglaterra marca nos dois primeiros remates à baliza. Os golos são de Scholes e McManaman, dois escudeiros de Beckham. “Ah, são simpáticos os teus portugueses, mas aqui é o alto nível, Régis. Bom regresso até à França”, disseram-me. Quatro minutos depois, o tiro incrível do Luís Figo começa a mudar tudo: é o arranque de um grande percurso pela Seleção no Euro’2000. E não só. Uma Seleção que não vou mais deixar. Desde esse jogo, aprendi a falar, ‘comme ci comme ça’, o português [n.d.r.: este texto de Régis foi escrito na língua portuguesa]. Estive nos estádios a assistir a todos os jogos de Portugal nas fases finais das competições internacionais, à exceção dos três que realizou no Mundial’2014. Testemunhei os momentos felizes, mas também os mais tristes: o fracasso da Coreia do Sul, a festa memorável no país inteiro durante o Euro’2004, a maturidade da Seleção de 2006 (provavelmente a mais forte da história) e, mais que tudo, a subida do Cristiano Ronaldo até ao céu. Lembro-me muito bem do primeiro encontro dele, em 2002, em Alcochete. Alguns dias antes, o António Tadeia dizia-me: “Há um craque no Sporting. Bölöni diz que
Desde 2000 que trabalho ao lado da ‘equipa de todos nós’, que é também um pouco a minha
será melhor do que o próprio Eusébio.” O treinador romeno deume duas prendas na minha carreira: descobrir os perceves (gosto muito dos mariscos) e o CR7 no início da sua carreira.
Com Ronaldo, assisti à transformação do futebol português, a chegada da Seleção ao mundo dos craques. Hoje, Portugal não tem a equipa mais forte do Mundo, mas pode ganhar o Mundial na Rússia. Não só graças a Ronaldo. Mas porque tem a alma, a força dos vence- dores. Já conquistou algo de muito importante. A evolução da equipa portuguesa nos últimos 18 anos é espetacular, muito maior do que a evolução dos clubes portugueses, deste clubismo que me parece um sobrevivente do século passado. No próximo dia 15 estarei, claro, na Arena de Sochi, como estive em Eindhoven em 2000, esperando um novo tiro português que poderá mudar a história. *