Futebol e direitos humanos
SOBRE A RÚSSIA COM AMOR
Juro que tenho dificuldade em compreender os critérios que orientam a FIFA aquando da escolha do país (ou países) onde se irá realizar o Campeonato do Mundo de futebol seguinte. As escolhas da Rússia e do Qatar foram duvidosas tendo em conta parâmetros muito importantes como são, por exemplo, o respeito pelos direitos humanos.
Umpaísqueinvadeoterritóriodosvizinhos não merece ser palco do maior acontecimento desportivo. Um país onde há dezenas de presos políticos deve ser excluído dessa escolha. Neste caso, estou a falar concretamente da Rússia. Enquanto decorre o Mundial, um cineasta ucraniano, Oleg Sentsov, que cumpre uma pena de prisão de 20 anos por “terrorismo, organização de um grupo terrorista e tráfico de armas”, está em greve de fome para exigir a libertação de numerosos presos políticos que se encontram nas cadeias russas.
Segundováriasorganizações internacionais, ele próprio é um preso político, pois o único crime que cometeu foi opor-se à anexação, em 2014, pelas tropas russas da Crimeia, região ucraniana onde ele nasceu e vivia. Numerosos cineastas e intelectuais russos, alguns deles incondicionais adeptos do presidente, bem como estrangeiros, lançaram um apelo a Vladimir Putin para o libertar, mas este faz de conta que não tem nada a ver com isso e atira o caso para cima dos tribunais, que ditam as sentenças que ele quer. Para o líder, o mais importante é que Sentsov não morra durante o Campeonato do Mundo, mas, se isso acontecer, também não o deverá preocupar muito.
Poucos dias depois de aFIFA ter escolhido México, Estados Unidos e Canadá para sede do Mundial de 2026, chegam-nos notícias preocupantes do desrespeito total pelo presidente norte-americano dos direitos humanos. Donald Trump separa crianças de pais que procuram uma vida melhor num país que se orgulhava de ser o refúgio dos povos. Mais: os EUA preparam-se para abandonar o Conselho de Direitos Humanos da ONU. E certamente que esta política irá continuar porque, infelizmente, faz aumentar o número de votantes em políticos populistas e racistas.
Terásidoumaboaescolhaa da FIFA? Eu considero que não, embora não esteja à espera de que ela possa mudar de posição, pois há outros interesses mais altos do que os direitos humanos. Os altos dirigentes políticos e desportivos teimam em não prestar atenção à história, mas a verdade é que ela se repete em aspetos que consideramos inacreditáveis pela sua desumanidade e crueldade.