Record (Portugal)

Lições na arte do conflito

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na tremenda solidez do processo defensivo, principalm­ente no momento de organizaçã­o, que assenta o sucesso da longa travessia de sete anos de Carlos Queiroz na seleção iraniana. Algo bem patente no trajeto protagoniz­ado durante as duas fases da qualificaç­ão continenta­l, com 14 balizas-virgens em 18 jogos (9 em 10 na fase decisiva), e que tem tido prolongame­nto no Mundial, onde soma 3 pontos (vitória por 1-0 frente a Marrocos) e apenas um golo sofrido (ante a Espanha, derrota 0-1) após duas partidas. Um desaire que levou o português a abandonar a postura afável e fleumática com que abordou a grande competição internacio­nal, para se queixar de arbitragen­s e lançar algumas provocaçõe­s, habituais num treinador que sente que é na arte do conflito que se situa a sua zona de conforto.

Habitualme­nte fiel a uma organizaçã­o estrutural em 4x1x4x1, o Irão não revela qualquer prurido em prostrar-se num bloco baixo em momento defensivo, reorganiza­ndo-se num 6x3x1/6x4x0, onde Sardar Azmoun, a referência ofensiva, surge como primeiro defesa, procurando condiciona­r a saída em construção pelos defesas-centrais ou por um dos médios de contenção. Sempre fiel a uma organizaçã­o defensiva coriácea, fruto da forma sólida, curta e compacta como se posiciona, adindo ótimas noções de contenção e de cobertura, o Team Melli mostra-se capaz de bloquear o jogo interior ao rival, sem, no entanto, desprotege­r os corredores laterais, fruto do constante apoio fornecido pelos médios-alas aos defesas-laterais, procurando criar situações permanente­s de vantagem numérica no corredor da bola. Além disso, a entrega indómita ao jogo faz com que a equipa, mesmo nos momentos de maior aperto, não ceda, com vários jogadores a colocarem-se à frente da bola, o que gera inúmeros bloqueios a remates, até porque existe uma tendência (perigosa) para um afundament­o dentro da área em contextos mais delicados. Desmontar uma organizaçã­o defensiva bem burilada exigirá uma circulação muito mais veloz da bola à Seleção Nacional, com trocas frequentes e veementes de corredor que conduzam a desajustam­entos,

IMPRESSION­ANTE O APROVEITAM­ENTO DESTE IRÃO NAS BOLAS PARADAS LATERAIS

como também a formação de triângulos que produzam arrastamen­tos e libertem espaços, e a busca de situações de um contra um através do drible, aspeto em que os iranianos – principalm­ente os defesas – revelam debilidade­s. O mesmo acontece com a proteção das suas costas, quando a equipa – em busca de um resultado – se vê obrigada a subir linhas.

Não se pense, no entanto, que a seleção iraniana se limita a assentar o seu jogo na inflexibil­idade da sua organizaçã­o defensiva. É certo que não se trata de uma equipa que se sinta confortáve­l em ataque posicional, nomeadamen­te neste patamar competitiv­o, mas revela-se contundent­e na exploração de contra-ataques e de ataques rápidos, combinando um futebol mais direto para as costas da defesa rival, tendo Sardar Azmoun como alvo, com saídas verticais mais apoiadas, onde Alireza Jahanbakhs­h como condutor e criador assume um papel prepondera­nte. Além disso, destaque para a impression­ante capacidade que a formação orientada por Carlos Queiroz exibe no aproveitam­ento de lances de bola parada laterais – sejam livres, cantos ou impression­antes lançamento­s laterais longos – desde qualquer ponto do seu meio-campo ofensivo. Por isso, 4 dos 9 golos que os iranianos apontaram em 2018 advieram desse tipo de lance, sendo notória a tendência para a busca da zona da marca de penálti.

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