Record (Portugal)

"RONALDO JAMAIS RENUNCIARA A SELECAO JOSÉ SEMEDO

- TEXTOS RICARDO LOPES PEREIRA FOTOS RICARDO NASCIMENTO

As pessoas reconhecem-no mais por ser jogador do V. Setúbal ou por ser um dos melhores amigos de Cristiano Ronaldo? JOSÉ SEMEDO – Acredito que antes de chegar ao Vitória me conheciam mais por ser amigo do Cristiano, mas as pessoas de Setúbal, por exemplo, veem-me mais como jogador do Vitória. Ser conhecido como grande amigo dele não me incomoda nada. + Lembra-se do momento em que o conheceu?

JS – Lembro-me perfeitame­nte. Era um miúdo pacato que não falava muito, madeirense, com sotaque cerrado, o que nos impedia de perceber algumas coisas. Foi num treino do Sporting e tínhamos 11 anos. Ele chegou e, de repente, começámos a vê-lo fazer o que víamos apenas o Ronaldo fazer no Barcelona ou o Ronaldinho no PSG, a fazer vírgulas e a fintar. Toda a gente parou para vê-lo. Lembro-me como se fosse hoje. + Quais as razões pelas quais se tornaram melhores amigos?

JS – Eu era de Setúbal e ele da Madeira. Estávamos ambos afastados de casa e tornámo-nos logo próximos. Éramos os mais novos e a amizade surgiu no centro de estágio onde estávamos com os sub-15 e sub-16 que já tinham contratos profission­ais. Nós éramos os miúdos e a partir daí cresceu a nossa amizade. + O facto de virem de meios desfavorec­idos aproximou-os?

JS – Creio que sim, mas penso que mais importante do que isso foi o facto de sermos os mais novos, partilharm­os o mesmo quarto e andarmos sempre juntos na escola e nos treinos.

+ Podiam ter seguido caminhos diferentes, mas isso não aconteceu. Qual o segredo da vossa amizade duradoura? JS – Acima de tudo, a lealdade e sermos verdadeiro­s um com o outro. Na nossa vida temos amigos de infância, mas quando chegamos à idade adulta, cada um segue o seu caminho. No nosso caso, por convivermo­s tanto tempo, acabámos por ver a lealdade e o amor entre pessoas que querem o bem umas das outras e se ajudam sempre que é preciso. É o que acontece entre nós, eu, o Cristiano, o [Miguel] Paixão, o Ricardo [Regufe] e o irmão do Ronaldo [Hugo]. É irmão, é amigo, uma pessoa honesta que está lá sempre para dar um conselho. Criámos uma família que não é de sangue. + Onde passaram férias juntos pela primeira vez?

JS – Foi no Mónaco, há cerca de cinco anos.

Devido ao Mundial este ano estão desencontr­ados…

JS – (Risos) É verdade, por razões profission­ais, este ano já não vai dar, mas falamos todos os dias.

Em 2017/18, Cristiano não o foi ver ao Bonfim. Poderá ser que esta época isso aconteça?

JS – Claro que sim. Ficaria muito feliz se ele pudesse vir. O Cristiano disse a época passada que as equipas que seguia eram o Sporting, por ter jogado lá e porque estava no clube o Fábio Coentrão, o Vitória, porque estou aqui eu, e o Besiktas, pelo Pepe e pelo Quaresma. Os vitorianos já sabem que o Cristiano torce por nós.

O Cristiano de hoje é diferente do que era há dez anos?

JS – É igual. É muito brincalhão, rise com tudo e gosta de estar sempre na brincadeir­a. Quando estamos juntos, é muito raro falarmos de futebol. Jogamos mais ténis.

Daqui a quatro anos Portugal continuará a ter o capitão?

JS – Acredito que sim. Penso que poderá não estar tão envolvido ao nível de todos os jogos das qualificaç­ões para poder chegar em melhor forma ao Mundial, mas, enquanto estiver no ativo, independen­temente da idade, jamais irá renunciar à Seleção. O Cristiano adora jogar por Portugal, ouvir o hino, e adora o entusiasmo do povo português.

Como viu o desempenho de Portugal no Mundial?

JS – Ao nível de um Mundial tudo se define por detalhes, um momento de desconcent­ração não permite que se volte atrás. Para mim, os ra- pazes foram uns campeões e temos de estar orgulhosos. Bateram-se bem num grupo muito difícil. Nos ‘quartos’, Portugal foi melhor equipa do que o Uruguai. Procurámos jogar mais e o adversário defendeu e apostou no contra-ataque. Jogaram como se fosse uma final: fechados e à espera de uma oportunida­de.

Curiosamen­te, a equipa não perdeu quando Cristiano marcou, facto que diz bem da sua influência… JS – Quer queiramos quer não, ele é, de longe, a estrela maior. Com todos os nossos antepassad­os, ‘Figos’ e ‘Eusébios’, o Cristiano foi o único na geração dele que conseguiu catapultar Portugal para outra dimensão. Cinco Bolas de Ouro não são por acaso. Nem eu nem os meus filhos e, provavelme­nte, nem os meus netos ou bisnetos devem ver outra pessoa carregar o nome de Portugal como o Cristiano carregou o nosso país.

Alguma vez pensou que o Cris-

“[CHEGARÁ À SEXTA BOLA DE OURO?] À SEXTA E À SÉTIMA! ENQUANTO ELE ESTIVER NO ATIVO TUDO É POSSÍVEL” “NEM OS MEUS NETOS OU BISNETOS DEVEM VER OUTRA PESSOA CARREGAR O NOME DE PORTUGAL COMO O CRISTIANO”

tiano poderia ser eleito vários anos como o melhor do Mundo? JS – Não, mas tive a certeza de que iria ser jogador profission­al de primeiro nível. Não sou só eu que o digo. O Aurélio Pereira e outros treinadore­s que passaram pela formação do Sporting dizem o mesmo, de certeza. Pelo caráter dele e pela qualidade do seu futebol, não havia dúvidas. Quanto a ganhar cinco Bolas de Ouro, era muito difícil antever isso. Sabíamos, isso sim, que não iria perder-se pelo caminho nem se iria deslumbrar. + Acredita que conseguirá chegar à sexta Bola de Ouro?

JS – À sexta e à sétima! Enquanto estiver no ativo, tudo é possível. Há três ou quatro anos dizia-se que estava a entrar na fase descendent­e por estar a chegar aos 30 anos. O que tem acontecido desde aí é que acaba sempre por fazer uma época melhor do que a anterior. A nível de jogos e golos não há limites, ele é especial. + Qual o sentimento do capitão quando falou com ele após a eliminação com o Uruguai? JS – Faltou uma pontinha de sorte. Estava chateado, triste e com sentimento de desilusão porque queria ganhar e continuar no Mundial. Tinha muita fé e confiança de que se passasse aquele jogo, Portugal chegaria à final. A confiança era tanta que, passando o Uruguai e indo jogar com a França, eles iriam lembrar-se da final do Europeu e isso iria jogar contra eles.

+ O gesto de Cristiano Ronaldo com Cavani correu o Mundo. Como viu esse momento? JS – Arrepio-me só de pensar. O Cris é um campeão em todos os sentidos, por mais que as pessoas digam que não é humilde. É um ser humano extraordin­ário, com um grande coração. O gesto dele é genuíno, viu que o Cavani estava com um problema muscular e foi ajudá-lo. *

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