Record (Portugal)

Quem é afinal o maior ‘pirata’?

QUEM SE INDIGNA POR TER VISTO O SEU SISTEMA INFORMÁTIC­O VIOLADO – E ESSE CRIME NÃO DEVE SER RELATIVIZA­DO –, NÃO PODE PERMANECER EM SILÊNCIO OU A FAZER DE CONTA PERANTE A ENORME GRAVIDADE DA INTRUSÃO NO APARELHO JUDICIAL

-

Tudo isto, no futebol português, já foi longe de mais. Vivemos a fase-pirata.

Luís Filipe Vieira e a SAD do Benficafiz­eram tudo par anão deixar cair o seu assessor jurídico, Paulo Gonçalves, que era na Luz, na denominada ‘estrutura’, uma das figuras com maior poder.

Em 12 anos, Paulo Gonçalves aconselhou,

ratificou, aprovou, reprovou, orientou e influencio­u milhares de decisões.

Acertaaltu­rade umlongoper­íodode12 anos, ainfluênci­ade Paulo Gonçalves

foi observada como positiva pela restante estrutura. Muitos considerav­am-no mesmo como ‘a’ estrutura, não apenas por dominar os mecanismos de transferên­cias, os regulament­os e o Direito desportivo, mas fundamenta­lmente por conhecer, de norte a sul, alguns dos principais protagonis­tas do futebol em Portugal. O ‘homem invisível’ –o ‘homem invisível’ que só se tornava visível (na invisibili­dade) quando era estritamen­te necessário. O ‘campeão’ para além do futebol das quatro linhas –e essa apreciação nem sequer deve conter, na totalidade, uma valoração negativa… Ele sabia, ele conhecia, ele influencia­va e vivia no perímetro principal da decisão, entre Domingos Soares de Oliveira e Luís Filipe Vieira. Com afecto(s) mas principalm­ente com toneladas de ‘pragmatism­o’.

Simplesmen­te PauloGonça­lves exagerou e passou das

marcas. A acusação, por maiores críticas que possa merecer do ‘gabinete de crise’ do Benfica, contém pormenores do ‘modus operandi’ benfiquist­a que, face à gravidade, não poderiam continuar a ser ignorados.

Ficaclaroq­ue, nolimite dadefesa dePauloGon­çalves (

vide comunicado­s), ou caía o assessor jurídico da Benfica SAD ou a Benfica SAD era arrastada, mais depressa, com ele, aumentando o risco da queda de Vieira e do ‘vieirismo’.

LuísFilipe Vieirae quemestá acossado (

para já) no E-Toupeira – toda a administra­ção da SAD –sabem que tinham de tentar abrir o pára-quedas, numa manobra muito próxima de uma ejecção num avião em chamas. Já se gastaram todos os extintores e, apesar de todas as declaraçõe­s de que não há fogo, e (alguns) bombeiros (benfiquist­as) são pirómanos, este acordo relativo à saída concertada de Paulo Gonçalves demonstra a convicção de que foi preciso accionar o plano de emergência para ejectar aqueles que querem perdurar como sobreviven­tes e se possível, até, como heróis.

ABenficaSA­D, comopessoa­colectiva, sabe que não pode ignorar as consequênc­ias das alíneas a) e b) do ponto 2 do Artigo 11 do Código Penal. Pode ter violado os “deveres de vigilância” ou “controlo que lhes incumbem”. Porque Paulo Gonçalves agiu “sob a autoridade” da Benfica SAD e, se a saída da Luz pode facilitar a defesa jurídica do Benfica, a verdade é que a Benfica SAD continua a ter um grande problema para resolver, depois de requerer a fase de instrução e o debate instrutóri­o que se lhe vai seguir, no sentido de o juiz decidir se a arguida deve ser submetida, ou não, a julgamento. ABenfica SAD está acusada de um crime de corrupção activa, um crime de oferta ou recebiment­o indevido de vantagem (com pena acessória prevista em diploma) e 28 crimes de falsidade informátic­a.

Acabou, portanto, o‘faz-de-conta’. O Benfica levou longe de mais a ideia pretensame­nte soberana de que Paulo Gonçalves actuava por sua conta e risco. Paulo Gonçalves foi longe de mais mas o Benfica também.

Quemseindi­gnaporterv­istoo seusistema­informátic­oviolado –e esse é um crime que não pode deixar de merecer repúdio geral –, não pode permanecer em silêncio perante a enorme gravidade da intrusão no sistema judicial, através da plataforma Citius.

É tãorelevan­te acondenaçã­opúblicade umhacker aparenteme­nte profission­al, a agir sozinho ou em associação com outras acções de pirataria informátic­a, quanto a condenação pública de alguém que se permite ‘legitimado’ para fazer o patrocínio da intrusão em diversos processos sob investigaç­ão. Quem é, afinal, o maior pirata? Qual foi a acção de pirataria mais eficaz? Que consequênc­ias tiveram essas acções na adulteraçã­o da verdade desportiva?

É necessário­e urgente aprocura daverdade no sentido de se perceber, como insinuou Varandas Fernandes, se o hacker Pinto agiu a mando do FC Porto e do Sporting e se algumas destas entidades pagou, ou não, ao ‘pirata’ agora descoberto.

Umacoisaéc­erta: dedevassae­m devassa, uma conclusão: o futebol, em Portugal, tem uma fortíssima componente mafiosa que é preciso desmantela­r. Com urgência. Averdade, porém, é que muita água vai passar debaixo das pontes e ninguém deve ter vontade de rir. Neste contexto, é crime. Vivemos a fase-pirata. *Textoescri­tocomaanti­gaortograf­ia

 ??  ?? GRAVIDADE DUPLA. A gravidade da situação que pode envolver o ‘hacker’ agora descoberto não relativiza a gravidade da acusação sobre Paulo Gonçalves
GRAVIDADE DUPLA. A gravidade da situação que pode envolver o ‘hacker’ agora descoberto não relativiza a gravidade da acusação sobre Paulo Gonçalves

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Portugal