Pelo direito ao Coliseu
Pedro Adão e Silva Professor Universitário
Sérgio Conceição tem razão muitas vezes, mas errou quando, há um par de semanas, após uma exibição sofrível no Dragão, se insurgiu com os adeptos que estavam descontentes com o nível exibicional do FC Porto. Para o treinador, quem quer espetáculo devia dirigir-se ao Coliseu ou ao Teatro Sá da Bandeira. Não é nova esta dicotomia entre vencer ou oferecer espetáculo, como se fosse necessário escolher entre as duas. Claro está que todos os adeptos preferem vencer com um futebol medíocre, a perder com nota artística. Em todo o caso, nada impede que se concilie bom futebol com vitórias e, além do mais, quem melhor joga é, também, quem mais próximo fica de vencer, nomeadamente em competições longas.
Regressoadomingo, aoEstádiodaLuz. Como todos os outros benfiquistas que se sentaram nas bancadas, não troco a vitória justa frente ao Porto por nada. Mas como, entre bilhetes de época para a família e subscrição da Sport TV, gasto bom dinheiro em futebol, tenho direito a exigir também espetáculo. Não só o futebol praticado no clássico foi pobre, como corresponde a uma trajetória de empobrecimento do jogar dos três grandes que deve ser motivo de reflexão.
Recorro, umavezmais, aoexcelente GoalPoint paradar contadoquese passou: um número risível de remates enquadrados (dois para o Benfica, um para o Porto); níveis negativos de eficácia nos passes verticais (42% e 38% e, no total, 221 passes falhados!), jogo muito fí- sico (44 faltas) e recorde do ano em partidas da Liga para duelos aéreos (66) –o que constitui novo máximo, a larga distância, em clássicos desde que há registos. Na ressaca do jogo, na sua conta de Twitter, o analista do GoalPoint, Hernâni Ribeiro, traçava um paralelo com o que, praticamente à mesma hora, se havia passado no LiverpoolMan. City. Os 23 duelos aéreos do clássico inglês contrastavam com os 66 do Benfica-FC Porto. Pode, assim, concluir-se que enquanto uns abandonam o ‘kick and rush’, noutras paragens esta opção faz escola.
Estesindicadorespodiamser apenasumacuriosidade estatística. Temo bem que sejam mais do que isso: o resultadismo está a instalar-se no campeonato português e as explicações são várias. Desde logo, um clima adversativo que reduz a propensão ao risco. Nos clássicos, os três grandes têm como prioridade anular o adversário e só atacam pela certa. Depois, uma diminuição evidente da qualidade individual dos protagonistas. Num passado recente, passaram por Portugal jogadores de topo. Hoje, há bastante qualidade nos plantéis do Benfica e do Porto. Contudo, já não há nem James, Falcao, Hulk ou Moutinho, de um lado, e Di María, Witsel, Gaitán ou Matic, do outro. Finalmente, no que é decisivo, os treinadores do Benfica e do Porto, se bem que com ideias muito diferentes, sacrificam uma ideia de jogo coletiva e associativa à eficácia. Nós, adeptos, não nos devemos conformar com isto.