BdC e as claques até este texto escangalharam
AS ASSOCIAÇÕES DE ADEPTOS, ASSUMIDAS OU NÃO, FUNCIONAM COMO BRAÇO ARMADO DAS SAD, NUMA RELAÇÃO PROMÍSCUA QUE ESCONDE, ENTRE OUTROS PECADOS, UM SUBMUNDO DE NEGÓCIOS ESPÚRIOS E LUCRATIVOS
BEM ANDOU VARANDAS QUANDO FECHOU A TORNEIRA. MAS ATÉ QUANDO O CONSEGUIRÁ?
Bruno de Carvalho (BdC) e as claques de futebol têm este inusitado dom (entre outros bem mais malignos) de nos escangalhar os planos num estalar de dedos. O balanço da semana futeboleira até parecia predispor a que tecêssemos um texto sobre a rara opulência do último jogo no Dragão, onde FC Porto e Sp. Braga se confirmaram como as equipas mais encorpadas e que mais e melhor futebol exibem, hoje em dia, no nosso país. E o maior elogio à capacidade e à prestação dos bracarenses talvez tenha sido a forma vulcânica como os jogadores e treinadores portistas festejaram no fim, num entusiasmo bem mais arrebatador do que se lhes tinha visto, por exemplo, após o importante triunfo sobre o Lokomotiv. O Braga continua a crescer em todos os sentidos, tem hoje estrutura, plantel, treinador e, agora, até adeptos para continuar a intrometer-se no pódio da Liga (até por não se desgastar na Europa). E, no sábado, só saiu derrotado porque desperdiçou mais do que era suposto e porque Sérgio Conceição viu premiado, ‘in extremis’, o seu atrevimento e engenho.
Mas havia ainda como alternativa temática para este escrito o triunfo do Benfica em Tondela. Que é bem capaz de não ter representado mais do que um armistício precário para Rui Vitória, porque as disformidades no processo de jogo e a dependência excessiva das individualidades continuam lá, e bem profundas. Sendo também certo que uma vitória, mesmo que comezinha, acaba sempre por mascarar os problemas, principalmente numa liga tão desigual como a portuguesa. O que vale é que o tempo acaba sempre por converter mais pessoas do que a razão…
E havia ainda os ‘parâmetros’ a que Frederico Varandas recorreu ontem para justificar a esco
lha de Marcel Keizer. O holandês já assistiu da bancada ao triunfo sofrido do Sporting sobre o Chaves, num jogo em que as decisões arbitrais, designadamente do VAR, também poderiam justificar uma análise. A começar pela certeza de que a tecnologia nunca será suficiente para resolver o despreparo e a névoa que pareceram afetar Tiago Martins e, principalmente, Manuel Oliveira. A verdade é que Keizer vai receber a equipa no segundo lugar – e com os mesmos dois pontos de atraso para o líder que já existiam quando Peseiro foi exonerado. A dúvida é se esta esperançosa classificação que lhe é entregue pelo intrépido e ambicioso Tiago Fernandes não vai acabar por funcionar como um pr sente envenenado. Para já, registe-se o facto de o presidente ter ontem deixado cla- ro que a restante equipa técnica ainda não está fechada, o que levanta algumas questões, designadamente o grau de autonomia de Keizer na escolha dos seus colaboradores.
Qualquer um destes tópicos
bastaria para resolver a questão do tema desta crónica. Mas ignorar as detenções de BdC e do líder da Juventude Leonina deixarme-ia com um peso na consciência. Importa, claro, salvaguardar a presunção de inocência, bem como a “total confiança no sistema judicial”, como ontem reagiu – e bem – o Sporting. Pena ter sido através de uma fonte anónima, o que indicia o quanto Bruno de Carvalho e as claques são ainda capazes de criar constrangimentos em Alvalade.
BdC está acusado de 56 crimes,
mas teremos de aguardar pela evolução do processo judicial para descobrirmos até que ponto chegou a sua postura autodestrutiva e peçonhenta. Mas, enquanto isso não se esclarece, mantenho o que desde há muito é para mim uma certeza: o Sporting desceu ao inferno com um falso e perigoso vendedor de quimeras. Que hoje já só tem uma pequena legião de devotos que se mantêm em negação, mas que durante demasiado tempo utilizou a sua capacidade de induzir e de encantar para quase se tornar unânime em Alvalade, conseguindo com isso (e, importa acrescentar, também com a escolha de bons treinado- res e com gastos nunca vistos) arrebatar até alguns espíritos livres e normalmente bem pensantes. Mas esses, que finalmente se livraram do encantamento, terão hoje de fazer ‘mea culpa’. Porque os indícios do que viria a tornar-se Bruno de Carvalho sempre estiveram lá e até já eram visíveis antes de perder as primeiras eleições a que concorreu.
Quanto ao líder da Juventude
Leonina, não me interessa apenas refletir sobre como é possível que alguém sentenciado por associação criminosa, roubo, sequestro e posse de arma proibida (o caso será novamente julgado, por uma minudência jurídica na fase de instrução) tenha conseguido o controlo mental de tantos jovens membros da Juve Leo – que, acredito, na sua maioria só aderem por gostarem verdadeiramente de futebol e do seu clube. Até por há muito defender que as organizações de adeptos (assumidas como tal, ou não) trazem muitíssimos mais prejuízos do que benefícios ao futebol, interessa-me mais, confesso, continuar a questionar a forma como as claques de vários clubes funcionam como braço armado das administrações, numa relação promíscua que esconde, entre outros pecados, um submundo de negócios espúrios e lucrativos. E quem tiver dúvidas que investigue como enriqueceram subitamente alguns deles. Bem andou Frederico Varandas quando fechou a torneira. Mas até quando o conseguirá?