Record (Portugal)

MORT E SÚBIT A PAVÃO FOI DOS PRIMEIROS A CAIR

Há 45 anos, o capitão do FC Porto tombou inanimado no relvado das Antas. Histórias que se repetem e são quase impossívei­s de evitar

- CAROLINA COUTO

Jornada 13 do campeonato português, em 1973. O FC Porto entrava em campo no antigo Estádio das Antas para defrontar o Vitória de Setúbal. Fernando Pascoal das Neves, mais conhecido por Pavão, cumpriment­ava, sorridente, Carlos Cardoso, o capitão dos sadinos. O entusiasmo era evidente nas bancadas, mas nada podia prever o que viria a acontecer aos 13 minutos de jogo. Depois de fazer um passe para Oliveira e mandar avançar a equipa, o capitão dos azuis e brancos caiu inanimado no chão. Naquele momento, o prognóstic­o não era bom mas também ninguém ficou alarmado. No fim do jogo, através do sistema de som do Estádio das Antas, todos ficaram a saber que Pavão tinha falecido. A causa era morte súbita. Dizem os que lá estavam, que o silêncio foi ensurdeced­or. Record falou com um médico especializ­ado em Medicina Des- portiva para tentar perceber este fenómeno que ‘teima’ em escrever páginas negras na história do desporto. Pedro Agnelo desvenda que, entre médicos, há uma frase chave que define a imprevisib­ilidade deste tipo de situações: “A morte súbita é quase sempre o primeiro sintoma de morte súbita.” Certo é que os tempos eram outros, mas ainda hoje continua a ser impossível evitar por completo este tipo de situações. “A Medicina não é uma ciência exata, e apesar de hoje em dia os exames serem mais específico­s e exigentes, a verdade é que a interpreta­ção de resultados como os do eletrocard­iograma são subjetivos. Mesmo com os critérios de Seattle, estes não deixam de ser apenas linhas que nos guiam. É impossível existir 100 por cento de objetivida­de nestas avaliações”, atira Pedro Agnelo, quando questionad­o sobre a possibilid­ade de prever e prevenir situações de morte súbita de atletas de alta competição.

Interpreta­ção clínica

Os critérios de Seattle são diretrizes para a interpreta­ção dos resultados de eletrocard­iogramas (ECG), exames feitos para observar a parte elétrica do coração, com o intuito de uniformiza­r a interpreta­ção por parte de cada médico. Estes critérios separam alterações normais (fisiológic­as) das patológica­s e potencialm­ente fatais. É ainda necessário acrescenta­r os fatores que podem fazer variar os resultados do ECG, nomeadamen­te a idade, o género, a etnia e o tipo de exercício. “Ter especialis­tas em Medicina Desportiva a fazer e a avaliar estes exames é fundamenta­l para que a própria disciplina possa evoluir. O problema é que se continua a ter médicos de clínica geral a fazer estas avaliações”, acrescenta ainda Pedro Agnelo, sublinhand­o outro detalhe importante: “Mesmo atletas sem qualquer patologia associa- da podem sofrer morte súbita. Porquê? Ninguém sabe responder.” O risco de morte súbita em atletas é cerca de três vezes superior ao do cidadão comum. E é exponencia­do pelo doping. Na altura da morte de Pavão, corriam rumores de que o capitão do FC Porto pudesse ser um dos que recorresse ao doping. Apesar de isto nunca poder vir a ser confirmado, certo é que não deixa de ser um alerta para os demais. E Pedro Agnelo vai mais longe: “Se o controlo antidoping fosse feito em condições, apanhávamo­s muito mais casos. Como há muitos interesses, há muitos exames que não são feitos.” *

RISCO DE MORTE SÚBITA EM ATLETAS DE ALTA COMPETIÇÃO É CERCA DE TRÊS VEZES SUPERIOR AO DOS CIDADÃOS COMUNS

 ??  ?? CRAQUE. Pavão tinha 26 anos e acabou por não resistir depois de colapsar em campo durante um jogo com o Vitória de Setúbal
CRAQUE. Pavão tinha 26 anos e acabou por não resistir depois de colapsar em campo durante um jogo com o Vitória de Setúbal
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