Record (Portugal)

PORQUE SE JOGA TÃO POUCO EM PORTUGAL?

Record confrontou treinadore­s, Liga, Conselho de Arbitragem e FPF sobre o tempo útil de jogo em Portugal, o mais baixo de 37 países da Europa

- DAVID NOVO

Se um jogo de futebol tem, normalment­e, 90 minutos, os adeptos portuguese­s só assistem a 45. Essa foi a conclusão do estudo do CIES Observatór­io do Futebol sobre o tempo útil de jogo em 37 campeonato­s europeus. A Liga NOS está em último lugar com 50,9% - uma análise referente às primeiras 10 jornadas do campeonato e com dados ‘InStat’. Este valor foi o ponto de partida para esta reportagem de Record: quais as razões para tantas paragens? De quem é a culpa? Que soluções existem? As respostas foram dadas pelos treinadore­s, pela Liga Portugal, pela Federação Portuguesa de Futebol e pelo Conselho de Arbitragem.

O alerta não é de agora. Em fevereiro, Rui Vitória foi um dos que veio a público lançar a discussão. “Somos o campeonato em que menos minutos se jogam num jogo, há muitas paragens e em muitos campeonato­s isso não acontece. Temos de ter a astúcia que os treinadore­s portuguese­s vão tendo, ter a capacidade de os clubes se reestrutur­arem melhor, apostar mais na formação e em termos coletivos deve haver uma reestrutur­ação. Do ponto de vista financeiro vamos ter sempre essa diferença, por isso temos de apresentar melhores espetáculo­s, melhores campos, melhores estrutu- ras... No fundo, uma série de coisas em que podemos melhorar”, atirou o treinador do Benfica. Sérgio Conceição, treinador de outro dos grandes, defendeu que o antijogo até favorece... os mais pequenos. “É algo que beneficia sempre a equipa teoricamen­te menos forte. Já represente­i equipas do género, mas não há nenhum jogador que possa vir dizer que eu lhe pedi para se deitar no chão ou para perder tempo. É culpa de toda a gente, mas no jogo do Bessa, por exemplo, nos primeiros 15 minutos só se jogaram três ou quatro. Aí a culpa foi do árbitro e, se calhar, do treinador e dos jogadores”, acrescento­u o treinador do FC Porto.

No entanto, nem todos analisam os números da mesma forma. “É uma questão cultural. Temos tendência de valorizar o que vem de fora, o jogador que está do outro lado é sempre melhor do que o nosso. A galinha da vizinha é sempre melhor do que a minha. A Suécia está em 1º lugar nesse estudo, e é o melhor campeonato? Temos 45 minutos de tempo útil, mas a liga inglesa, que é dos melhores campeonato­s, tem 50 minutos. Quando olho para os 330 milhões que o futebol fatura fico triste quando as pessoas que vivem de futebol lhe dão ‘porrada’. Não é por acaso que somos um mercado que vende treinadore­s e jogadores”, atirou o técnico do Sp. Braga, ao mesmo tempo que apontou uma solução: “Sejam mais equilibrad­os nas receitas económicas.” Uma opinião partilhada por João Henriques, treinador do Santa Clara. “Por um lado, existe uma questão cultural. O jogador latino tem a caracterís­tica de cair muitas vezes e de reclamar com os árbitros. Por outro lado, as diferenças de poderio financeiro são abismais. Se dessem a todos os 18 clubes as mesmas condições de orçamento, com os mesmos treinadore­s, não tenho dúvidas de que o tempo útil de jogo iria disparar”, assegurou o técnico.

Análise global

Tantas vezes elogiado pelo futebol positivo que aplica nas suas equipas, Luís Castro defendeu que é preciso ter uma visão alargada de vários aspetos para perceber o que leva a um campeonato com tantas paragens. “O futebol português tem por hábito reagir a números, quando o que interessa é o global. O futebol português tem de ser pensado como um todo, quando quiserem pensar o futebol português reagindo a um número que aparece… vamos fazer uma reunião por causa do tempo de jogo, não adianta. Adianta perceber em que condições treinamos, em que condições jogamos, quantos espectador­es temos, como vai ser o futuro do futebol português, quem está interessad­o, quem se senta à mesa, quantas vezes os treinadore­s são ouvidos. Depois aí encontramo­s uma solução”, atirou o técnico vimaranens­e.

Já Lito Vidigal, técnico do V. Setúbal, criticou a diferença de tratamento. “Quando os clubes mais fortes estão em vantagem, fazem antijogo e dizem que é estratégia, algo que acontece com frequência. Quando são os clubes com menos força já é antijogo.” *

QUESTÃO CULTURAL E DIFERENÇAS FINANCEIRA­S SÃO JUSTIFICAÇ­ÕES APONTADAS PELOS TREINADORE­S DA 1ª DIVISÃO

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